Especialistas debatem, no Museu do Amanhã, desafios regulatórios que limitam o acesso do país ao financiamento sustentável global
O Brasil está diante de uma oportunidade histórica para se tornar protagonista da transição energética global, mas enfrenta um obstáculo recorrente: a insegurança jurídica. A avaliação é de Luan Santos, coordenador de Pesquisas do Climate Finance Hub Brasil (CFH Brasil), que participou da aula magna do programa “Finanças Climáticas do Amanhã”, realizado pelo Museu do Amanhã em parceria com o Instituto Clima e Sociedade (iCS). O evento reuniu especialistas para discutir os desafios do financiamento climático e a urgência de construir um ambiente seguro e transparente para atrair capital ao país.
Segundo Santos, embora os investimentos em energia renovável tenham batido recordes mundiais — superando US$ 2 trilhões no último ano —, apenas 16% desses recursos chegam aos países em desenvolvimento, como o Brasil. “Enquanto quase metade dos investimentos em combustíveis fósseis é destinada aos países do Sul Global, a maior fatia dos aportes em energia limpa ainda está concentrada nas economias desenvolvidas”, destacou.
O gargalo da insegurança jurídica
Para Luan, a falta de segurança jurídica é o principal entrave que impede o Brasil de acessar de forma massiva o mercado global de finanças climáticas. “O dinheiro existe. O que falta são regras claras, estabilidade regulatória e garantias que deem conforto ao investidor privado. Enquanto houver insegurança jurídica, o investimento privado não virá”, afirmou.
Ele ressalta que o avanço do marco regulatório do mercado de carbono no Brasil, especialmente após a aprovação da Lei do Combustível do Futuro (14.993/24), é um passo relevante, mas insuficiente sem alinhamento completo entre as esferas pública, privada e financeira.
“O novo marco permite a interligação entre os mercados regulado e voluntário, o que é essencial para gerar previsibilidade, escalabilidade e liquidez para os investimentos. Quando o investidor enxerga regras estáveis e uma demanda garantida, o risco diminui e os projetos saem do papel”, explicou.
Financiamento climático: onde estão os desafios
De acordo com dados apresentados, 97% dos recursos destinados a projetos de uso do solo no Brasil, como agricultura de baixo carbono e combate ao desmatamento, vêm do mercado doméstico, via crédito subsidiado e políticas públicas. O capital internacional, seja de fundos multilaterais, bancos de desenvolvimento ou fundos privados, representa uma fração muito pequena do financiamento climático no país.
Esse dado revela um ciclo preocupante de dependência interna, que limita a capacidade do Brasil de escalar projetos sustentáveis na velocidade necessária para atingir as metas de neutralidade de carbono até 2050, estabelecidas no Acordo de Paris.
O papel da informação e da transparência
Durante o evento, Luan apresentou o estudo “Mapping Brazil’s Ecosystem for Climate Finance 2025“, produzido pelo CFH Brasil, que mapeia 37 iniciativas-chave do ecossistema de finanças climáticas no país. O levantamento aponta avanços, como o aumento de empresas com metas climáticas, mas também destaca gargalos, como baixa adesão a padrões internacionais e falta de integração entre os setores público e privado.
“Se não houver uma estratégia clara, com governança robusta, transparência nos dados e alinhamento institucional, o Brasil perderá a janela de oportunidade histórica que se abre, especialmente com a realização da COP 30, em novembro, no Pará”, alertou.
Formação de lideranças para destravar a transição
O evento contou também com a participação de Rogério Studart, economista e ex-diretor do Banco Mundial, e Fábio Scarano, curador do Museu do Amanhã. Segundo Studart, o curso “Finanças Climáticas do Amanhã” foi estruturado para formar lideranças capazes de compreender tanto os desafios ambientais quanto os mecanismos financeiros necessários para viabilizar a transição climática.
O programa oferece 60 vagas, divididas entre participantes presenciais no Rio de Janeiro e alunos online de todas as regiões do Brasil. As inscrições estão abertas até 13 de julho no site do Museu do Amanhã.
“O financiamento climático não é apenas um problema econômico. É uma questão de confiança, clareza institucional e capacidade de execução. Sem isso, não haverá nem capital, nem transição”, concluiu Luan.