Medida atinge 24 iniciativas financiadas no governo anterior, incluindo projetos da ExxonMobil e Heidelberg Materials, e sinaliza mudança drástica na política energética americana
O Departamento de Energia dos Estados Unidos (DOE) anunciou, na última sexta-feira (24), o cancelamento de subsídios no valor de US$ 3,7 bilhões destinados a 24 projetos de energia verde financiados durante o governo do ex-presidente Joe Biden. A medida, articulada sob a gestão do atual presidente Donald Trump, representa uma guinada significativa na política energética do país e evidencia a tentativa de desmantelar parte do legado climático deixado pela administração anterior.
Os subsídios cancelados incluíam aportes expressivos para projetos estratégicos de descarbonização industrial. Entre os mais impactados estão:
- US$ 332 milhões para a ExxonMobil, em um projeto no complexo de refinaria de Baytown, no Texas;
- US$ 500 milhões para a Heidelberg Materials, na Louisiana;
- US$ 375 milhões para a Eastman Chemical Company, em Longview, também no Texas.
Reversão da política climática dos EUA
A suspensão dos recursos faz parte de uma análise mais ampla conduzida pela nova administração republicana sobre os empréstimos e incentivos concedidos a tecnologias emergentes de baixo carbono. De acordo com o DOE, cerca de 70% dos contratos cancelados foram assinados entre o dia da eleição presidencial (5 de novembro de 2024) e 20 de janeiro de 2025, último dia do mandato de Biden. A interpretação do governo atual é que esses acordos foram “precipitados” e carecem de avaliações adicionais de mérito técnico e retorno econômico.
Com a decisão, o governo Trump reafirma seu compromisso com a expansão da produção de petróleo e gás, setores que atingiram níveis históricos de exploração e exportação. A atual gestão argumenta que é necessário reorientar os investimentos públicos para tecnologias que garantam a “segurança energética” dos EUA sem comprometer a competitividade da indústria nacional.
Projetos visavam descarbonização industrial
Os projetos interrompidos tinham como objetivo principal a redução das emissões industriais por meio de tecnologias inovadoras de captura de carbono, eletrificação de processos e uso de hidrogênio verde. Um dos destaques era o projeto da ExxonMobil, que buscava substituir o gás natural por hidrogênio na produção de etileno, insumo fundamental para as indústrias de resinas plásticas, embalagens e têxteis.
Outro projeto cancelado, da Heidelberg Materials, pretendia desenvolver um sistema de produção de cimento com emissões líquidas zero, aproveitando novas rotas tecnológicas para captura e armazenamento de CO₂.
Especialistas afirmam que o cancelamento dos subsídios representa um duro golpe à descarbonização do setor industrial norte-americano, justamente quando a competição internacional por tecnologias limpas se intensifica, principalmente com as estratégias industriais verdes da União Europeia e da China.
Impactos e incertezas para o setor energético global
A decisão do governo Trump gera repercussões além das fronteiras americanas. Ao enfraquecer os incentivos a projetos de energia limpa, os Estados Unidos enviam um sinal de incerteza regulatória para investidores e fabricantes globais, que veem no país um dos principais polos de desenvolvimento de tecnologia climática.
Para o setor de energia elétrica, a reversão de políticas pode afetar planos de integração de renováveis à matriz energética, investimentos em infraestrutura de hidrogênio e ampliação de redes inteligentes. Em um contexto de emergência climática global, o recuo na agenda climática norte-americana pode dificultar metas coletivas de neutralidade de carbono e pressionar outras nações a assumirem maior protagonismo.
Entre a transição energética e a geopolítica do petróleo
Analistas políticos enxergam na decisão uma tentativa do governo Trump de reposicionar os Estados Unidos como potência energética baseada em combustíveis fósseis, priorizando o curto prazo econômico em detrimento de compromissos ambientais. A medida também antecipa conflitos institucionais com estados e cidades que continuam implementando políticas climáticas locais — especialmente Califórnia e Nova York.
A suspensão dos subsídios à energia limpa evidencia um embate estrutural entre dois modelos energéticos:
- De um lado, a economia de baixo carbono, apoiada em inovação tecnológica, integração global e descarbonização;
- Do outro, a manutenção de cadeias fósseis, com foco em autossuficiência e segurança energética tradicional.
Enquanto isso, empresas como ExxonMobil, Heidelberg e Eastman Chemical precisarão revisar seus planos de transição energética e buscar novas fontes de financiamento ou redirecionamento estratégico para manter competitividade e reputação ambiental.