Crescimento acelerado da demanda, digitalização e Inteligência Artificial pressionam o sistema elétrico. Especialistas apontam que baterias BESS são essenciais para garantir segurança, estabilidade e sustentabilidade na matriz energética brasileira
No dia 29 de maio, o mundo celebra o Dia Mundial da Energia, uma data criada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para destacar a importância do acesso universal, seguro e sustentável à energia. No Brasil, o tema ganha relevância não apenas pela sua matriz predominantemente renovável, mas pelos desafios estruturais que ameaçam a segurança elétrica e o avanço da transição energética.
O país é frequentemente apontado como uma referência global no uso de fontes limpas. Mais de 84% da eletricidade brasileira vem de fontes renováveis, como hidrelétricas, usinas solares, eólicas e biomassa. No entanto, esse cenário positivo esconde um problema crescente: a infraestrutura elétrica brasileira não acompanha o ritmo da digitalização, da eletrificação e do avanço de tecnologias como Inteligência Artificial (IA), computação em nuvem e a expansão acelerada de data centers.
“Temos muito a celebrar no Dia Mundial da Energia: somos referência em energia limpa. Mas também é um momento de realismo. A infraestrutura do sistema elétrico brasileiro está sobrecarregada e não acompanha o avanço tecnológico. A transição energética não é só gerar energia limpa — é garantir que ela chegue com qualidade, segurança e confiabilidade a todos os consumidores”, alerta Ty Eldridge, CEO da Brasol, empresa especializada em ativos de transição energética, com Siemens e BlackRock como sócios.
Crescimento digital pressiona a rede elétrica
O crescimento exponencial do consumo energético impulsionado pela transformação digital impõe desafios sem precedentes ao sistema elétrico. Data centers, IA e serviços em nuvem operam 24 horas por dia, exigindo fornecimento contínuo e altamente estável. Além disso, o caráter intermitente das fontes renováveis — dependentes de vento e sol — agrava a complexidade do fornecimento.
Quando a geração renovável não atende à demanda, o país ainda recorre às usinas térmicas fósseis, encarecendo a energia e elevando as emissões de gases de efeito estufa.
Armazenamento de energia: solução urgente e viável
A resposta a esses desafios está no avanço dos sistemas de armazenamento de energia por baterias, conhecidos como BESS (Battery Energy Storage Systems). Essa tecnologia, já amplamente utilizada em mercados como Estados Unidos, Austrália, China e Chile, permite armazenar o excedente de geração de energia — especialmente solar e eólica — e liberá-lo nos momentos de maior demanda ou quando há baixa geração.
“O armazenamento é a peça que falta para garantir um sistema energético mais resiliente, eficiente e sustentável. Ele reduz a dependência de usinas térmicas, estabiliza a rede e pode ser implantado rapidamente, de forma modular e escalável”, explica Eldridge. “Não é mais futuro. É presente. E é urgente.”
Benefícios que vão além da estabilidade
O uso de baterias BESS não beneficia apenas o sistema como um todo, mas também consumidores e empresas. Com o armazenamento, é possível:
- Reduzir o desperdício de energia gerada;
- Tornar os sistemas renováveis mais rentáveis, permitindo que geradores vendam energia nos horários de maior valor;
- Aumentar a autonomia energética, especialmente em áreas remotas e no agronegócio;
- Melhorar a qualidade do fornecimento e reduzir custos;
- Contribuir diretamente para a descarbonização da matriz energética.
O entrave: falta de regulamentação
Apesar do potencial, o avanço do mercado de armazenamento no Brasil esbarra na ausência de uma regulamentação específica. Sem regras claras sobre remuneração, operação, conexão à rede e responsabilidades dos operadores, investidores enfrentam insegurança jurídica, o que retarda projetos essenciais.
“O Brasil tem tudo para liderar essa nova fronteira energética”, afirma Eldridge. “Estudo da consultoria Greener estima que o mercado de armazenamento com baterias junto ao consumidor movimente mais de R$ 22,5 bilhões até 2030, impulsionado pela redução dos custos das baterias de lítio e pela demanda crescente por soluções inteligentes.”
Mas, para isso, é fundamental acelerar o desenvolvimento de um marco regulatório que integre o armazenamento ao planejamento energético nacional.
Energia solar e inclusão social na transição
O papel do armazenamento se soma ao crescimento da energia solar fotovoltaica, que já ultrapassa 37 GW de potência instalada no Brasil, segundo dados da Absolar. Contudo, ainda há desafios para democratizar o acesso. A energia solar permanece concentrada em consumidores com maior poder aquisitivo, enquanto milhões de brasileiros seguem na pobreza energética.
“A energia solar precisa ser inclusiva. É essencial que o governo crie programas de financiamento acessíveis, incentive a geração distribuída e reduza a burocracia”, afirma Maurício Crivelin, CEO da Kinsol, empresa focada em soluções solares com impacto social.
Desafio e oportunidade
O Dia Mundial da Energia serve de alerta e de oportunidade. O Brasil está em posição estratégica para liderar a transição energética global, mas isso exige enfrentar gargalos estruturais e regulatórios. A combinação entre energia renovável, digitalização e armazenamento de energia é a chave para garantir um futuro energético limpo, seguro e resiliente.