Divisão entre diretores da agência reguladora acende alerta sobre o impacto futuro nas contas de luz dos consumidores
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) adiou, nesta terça-feira (12), a decisão sobre o reajuste tarifário da distribuidora CPFL Santa Cruz, responsável pelo fornecimento de energia em municípios do interior de São Paulo, além de cidades no Paraná e em Minas Gerais. O motivo do adiamento foi um pedido de vista feito pelo diretor Fernando Mosna, que travou a deliberação em meio a um impasse sobre um pedido de diferimento tarifário solicitado pela concessionária.
A medida proposta pela CPFL Santa Cruz prevê um aumento controlado das tarifas em 2025 e 2026, evitando um reajuste expressivo no ano seguinte. No entanto, a proposta gerou divergências entre os diretores da Aneel. Enquanto parte da diretoria defende a aplicação da redução tarifária calculada pela área técnica da agência, outro grupo argumenta que a redistribuição do reajuste pode garantir maior previsibilidade ao consumidor.
O caso da CPFL Santa Cruz segue a mesma linha de debate que já havia ocorrido na semana anterior, quando a Aneel também adiou a decisão sobre o reajuste da Light, concessionária que atende o Rio de Janeiro. A polêmica em torno das tarifas de energia se intensifica em um momento em que o governo federal monitora os impactos da conta de luz sobre a inflação e o poder de compra da população.
Diferimento tarifário: suavização ou postergação de custos?
De acordo com os cálculos da área técnica da Aneel, a CPFL Santa Cruz poderia reduzir suas tarifas em 3,44% em 2025, beneficiando imediatamente os consumidores. No entanto, a concessionária argumenta que essa redução momentânea resultaria em um aumento muito maior no ano seguinte. Pelas projeções da distribuidora, o reajuste poderia chegar a 18,52% em 2026, devido ao término da devolução de créditos tributários que vinha atenuando as tarifas nos últimos anos.
Para evitar essa variação abrupta, a CPFL propôs um diferimento tarifário que resultaria em aumentos mais suaves: 3,3% em 2025 e 3% em 2026. Essa proposta foi endossada pelo Conselho de Consumidores, que representa os interesses dos usuários da distribuidora e defende maior previsibilidade nos reajustes.
Entretanto, a medida não é consenso dentro da Aneel. A diretora Agnes da Costa, relatora do processo, votou contra o diferimento, argumentando que a distribuidora não atende aos critérios de elegibilidade para adotar esse mecanismo. Segundo ela, a postergação de custos pode criar um efeito cascata prejudicial ao longo dos anos, impedindo que os consumidores usufruam dos benefícios de uma eventual redução tarifária.
O mesmo posicionamento foi adotado pela diretora Ludimila Silva, que demonstrou preocupação com o uso recorrente desse mecanismo. “Meu receio é que a gente caminhe para nunca ter um efeito negativo. Que a gente sempre esteja tentado a formar o colchão (de recursos) e não passe para o consumidor, naquele processo tarifário, o direito de ter redução da tarifa”, afirmou.
Por outro lado, os diretores Fernando Mosna e Ricardo Tili manifestaram apoio à proposta da CPFL, seguindo um precedente já adotado no caso da Copel, no Paraná. Em 2023, a Aneel aprovou o diferimento para a concessionária paranaense e, desde então, discute a adoção de critérios definitivos para essa prática.
O impacto do impasse nas tarifas de energia
Os reajustes tarifários são processos anuais conduzidos pela Aneel, com base em revisões técnicas sobre os custos das distribuidoras e a necessidade de investimentos no setor. Essas atualizações têm impacto direto sobre os índices de inflação, principalmente nos grandes centros urbanos.
No caso da Light, por exemplo, a empresa atende 75% da região metropolitana do Rio de Janeiro, onde a energia elétrica representa aproximadamente 10% do IPCA, o índice oficial de inflação no Brasil, segundo dados da TR Soluções. Esse contexto amplia a preocupação do governo com a alta dos preços e o impacto sobre o custo de vida da população.
O adiamento da decisão sobre a CPFL Santa Cruz também se soma a um calendário extenso de reajustes tarifários previstos para abril. Concessionárias como CPFL Paulista, Enel Ceará, Neoenergia e Energisa terão seus processos avaliados pela Aneel nas próximas semanas, o que pode aumentar ainda mais a pressão sobre a agência reguladora para definir uma diretriz clara sobre o diferimento tarifário.
Até agora, a Aneel já aprovou uma redução média de 3,70% nas tarifas da Roraima Energia e um aumento de 0,27% na Enel RJ, ambos sem a adoção do diferimento tarifário.
Próximos passos
Com o pedido de vista, a decisão sobre o reajuste da CPFL Santa Cruz ficará suspensa até nova deliberação dos diretores da Aneel. Enquanto isso, o debate sobre a melhor forma de estabilizar as tarifas sem comprometer o equilíbrio econômico-financeiro do setor elétrico segue aberto.
Independentemente do desfecho, o dilema entre aplicar reduções imediatas ou suavizar os reajustes futuros permanece como um dos maiores desafios para a regulação do setor elétrico brasileiro.