Agência rejeita repasse de custos não técnicos ao consumidor; distribuidora, em recuperação judicial, enfrenta desafios financeiros e operacionais na concessão
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) indeferiu nesta terça-feira (5 de novembro) o pedido da Light para um reajuste extraordinário nas tarifas de energia elétrica no estado do Rio de Janeiro. A distribuidora buscava implementar uma Revisão Tarifária Extraordinária (RTE) para repassar aos consumidores o custo das chamadas perdas não técnicas, categoria que inclui principalmente furtos de energia — popularmente conhecidos como “gatos” — e outras perdas operacionais não relacionadas à qualidade do serviço prestado.
Em decisão unânime, a diretoria colegiada da Aneel, com o relator do processo, Fernando Mosna, apoiando a recomendação do corpo técnico da agência, concluiu que não há justificativas contratuais suficientes para um aumento na tarifa dos consumidores. Segundo Mosna, a ausência de mudanças estruturais nos contratos de concessão da Light não justifica o pedido de revisão extraordinária.
Contexto das Perdas Não Técnicas e Limites Estabelecidos pela Aneel
Para o atual ciclo tarifário (2022-2026), a Aneel definiu um limite de perdas não técnicas para a Light, variando entre 42,9% e 40,7%. Essas porcentagens, que já podem ser parcialmente repassadas aos consumidores, refletem o custo associado a perdas de energia que não são de responsabilidade direta da empresa, como furtos e inadimplência. No entanto, a Light solicitou uma elevação desse limite para até 53,8%, alegando que tal ajuste ajudaria a cobrir as despesas operacionais crescentes com as perdas não técnicas.
O furto de energia é um problema significativo no Rio de Janeiro, uma das regiões mais afetadas pelo chamado “gato” no país. Essa prática impacta diretamente a Light, tanto na qualidade do serviço quanto em sua viabilidade financeira. Com uma dívida estimada em R$ 11 bilhões, a distribuidora está em processo de recuperação judicial desde maio de 2024. O pedido de aumento tarifário foi uma tentativa da empresa de mitigar parte do impacto financeiro das perdas não técnicas e alcançar equilíbrio econômico.
Recuperação Judicial e a Concessão da Light
A grave crise financeira enfrentada pela Light levou a Aneel a abrir um processo, em maio deste ano, para avaliar a continuidade da concessão da empresa. A análise foi motivada pelos riscos de descumprimento das obrigações contratuais, devido à situação econômica da distribuidora, que compromete seu desempenho e sua capacidade de atender a população com qualidade e segurança.
No entanto, após uma análise aprofundada, a Aneel optou por arquivar o processo, permitindo que a Light mantenha a concessão enquanto tenta se reestruturar. Essa decisão dá à empresa a oportunidade de continuar com seu plano de recuperação judicial, embora o cenário continue desafiador, com dificuldades em garantir investimentos e melhorar a infraestrutura para reduzir as perdas operacionais.
Impacto da Decisão da Aneel para a Light e os Consumidores
A negativa da Aneel em permitir um reajuste extraordinário pode agravar a situação financeira da Light, já que a empresa ficará responsável por cobrir as perdas operacionais sem o repasse direto dos custos aos consumidores. Segundo analistas do setor, a decisão é um sinal de que a agência reguladora busca proteger o consumidor de aumentos tarifários frequentes e, ao mesmo tempo, responsabilizar a distribuidora pela eficiência na gestão e combate ao furto de energia.
Especialistas em regulação energética apontam que a decisão pode pressionar a Light a intensificar as ações contra o furto de energia. No entanto, tais ações demandam investimentos significativos em tecnologia e infraestrutura, o que é um desafio para a empresa, considerando sua situação financeira. Outro ponto de atenção é o impacto na qualidade dos serviços, uma vez que a Light precisa equilibrar os custos de operação com as demandas de infraestrutura e segurança energética.
Futuro da Light e os Desafios do Setor de Distribuição de Energia
A situação enfrentada pela Light é reflexo de um problema mais amplo no setor de distribuição de energia no Brasil. Distribuidoras em áreas de alta densidade urbana e socialmente vulneráveis, como o Rio de Janeiro, enfrentam dificuldades para controlar as perdas não técnicas, que se intensificam em cenários de crise econômica e informalidade. O “gato” representa um dos principais desafios, demandando uma estratégia coordenada entre governo, distribuidoras e sociedade.
No caso da Light, o processo de recuperação judicial e a negativa ao reajuste extraordinário trazem incertezas quanto à sua capacidade de operar de maneira sustentável. A distribuidora terá que reavaliar sua estratégia para lidar com o furto de energia e manter a qualidade dos serviços, buscando alternativas para compensar as perdas financeiras sem repassar o custo diretamente aos consumidores.
A situação da Light coloca em evidência a necessidade de revisar e aprimorar as políticas regulatórias e de segurança para o setor elétrico, especialmente em regiões com alta incidência de furtos de energia. Novas tecnologias de monitoramento e combate às perdas podem ser um caminho, mas, para muitas empresas, a viabilidade financeira é um fator limitante. Nesse contexto, é crucial que os órgãos reguladores e os governos busquem alternativas para apoiar distribuidoras e reduzir o impacto das perdas não técnicas, garantindo um serviço mais eficiente e acessível para a população.