O cenário do setor de energia elétrica no Brasil em 2024 e as perspectivas para 2025: oportunidades e desafios para o mercado de arbitragem

Data:

Compartilhe:

Por Silvia Rodrigues Pachikoski – advogada, sócia de L.O. Baptista Advogados e especialista no segmento de energia, sobretudo em arbitragens

O setor de energia elétrica brasileiro passa por uma transformação significativa, marcada pela expansão das fontes renováveis, a abertura do mercado livre de energia e crescente demanda por soluções sustentáveis.

A matriz energética brasileira continua a ser predominantemente renovável, ainda com destaque para a hidrelétrica. Somado a isso, o crescimento acelerado de outras fontes, como a solar e eólica, tem diversificado o sistema elétrico, em um cenário de redução da participação de hidrelétrica com grandes reservatórios.

Esse movimento é acompanhado pelo (i) aumento expressivo na adoção de tecnologias de geração distribuída, na qual os consumidores instalam e investem em sistemas fotovoltaicos para a compensação do consumo em suas residências e empresas, pela (ii) abertura gradual do mercado livre; pelas (iii) discussões sobre a alocação eficiente de custos e riscos e redução de subsídios; e pela (iv) inserção de soluções de armazenamento de energia e redes inteligentes, preparando-se para uma futura integração mais eficiente entre produção e consumo.

Como resultado dessa mudança, o Brasil enfrenta o desafio de equilibrar a ampliação de sua capacidade de geração energética com a necessidade de modernizar marcos regulatórios e de captar investimentos para aprimorar a infraestrutura. Dentre esses desafios, estão a coordenação da operação de um sistema cada vez mais complexo e de esgotamento da capacidade de transmissão em vários pontos do sistema elétrico.

A atração dos investidores estrangeiros depende de um ambiente de negócios estável, sobretudo, com previsibilidade e segurança jurídica. Não por outro motivo, o crescimento do setor é acompanhado pela celebração de acordos dos mais variados tipos. São cada vez mais frequentes os contratos de EPC e similares para construção das plantas, os contratos acessórios para prestação de garantias, os contratos de fusões e aquisições e a criação de joint ventures para constituição dos veículos de investimento, bem como típicas obrigações de compliance aos mais elevados padrões de governança – os deveres da agenda ESG.

Com o aumento do fluxo econômico no setor e com a sofisticação das intrincadas relações comerciais, a estabilidade jurídica perseguida também depende de métodos de resolução de conflitos eficientes, que respondam às necessidades particulares desse ambiente negocial. Neste cenário, a arbitragem mostra-se imprescindível.

A possibilidade de indicação de julgadores que sejam experts na matéria e ainda assim sejam imparciais e independentes, o amplo espaço reservado à autonomia das partes, a escolha de procedimentos confidenciais, e a celeridade indispensável para assegurar o retorno financeiro e preservar a equação econômica do contrato, compõem o extenso rol de inquestionáveis vantagens que fazem da arbitragem um instituto apto a garantir estabilidade ao ramo dos negócios no setor elétrico.

A arbitragem tem se mostrado propícia para a resolução de disputas complexas, tais como aquelas que envolvem questões energéticas. É o caso, por exemplo, das obras de engenharia envolvidas na construção de usinas hidrelétricas, parques eólicos, centrais solares e outras infraestruturas.

Essa realidade está refletida em contratos altamente complexos, que comumente preveem a resolução de eventuais conflitos por meio de arbitragem, ou que, pelo fluxo contratual e/ou financeiro demandam soluções mais céleres. Se em determinado caso a arbitragem foi expressamente vedada em contrato de concessão de uso de bem público, recentemente passou por uma reformulação no segmento de comercialização, no qual o seu uso é obrigatório, conforme o caso, desde 2004 por força da Lei nº 10.848/2004.

E a perspectiva é de que o setor energético demande o instituto cada vez com maior intensidade a partir, por exemplo, da abertura do mercado livre de energia, em razão do aumento significativo no número de contratos negociados diretamente entre geradores e consumidores. Da mesma forma, tal aumento decorre do fato de o Brasil ter atraído investimentos estrangeiros significativos para o desenvolvimento de infraestrutura energética em virtude de sua matriz renovável em expansão e de sua estratégica posição geográfica na América Latina.

O aumento de seu uso deve-se, ainda, ao envolvimento cada vez maior de empresas e consórcios internacionais, que escolhem a arbitragem para litigar em um ambiente neutro, sem privilégios de jurisdição e com a garantia de especialidade, celeridade e confidencialidade. O próprio Banco Mundial exige que suas operações de financiamento de projetos de investimento constem no contrato a cláusula compromissória, a fim de que eventuais conflitos sejam resolvidos por meio de arbitragem. Do mesmo modo, o Banco Mundial determina a utilização de Dispute Boards (“DBs”) em projetos com valor de financiamento superior a 20 milhões de dólares.

O DBs, ferramenta de sucesso em contratos complexos de infraestrutura, são comitês permanentes compostos por representantes das partes envolvidas e por especialistas técnicos e jurídicos, que monitoram o progresso do projeto, identificam potenciais conflitos e propõem soluções preventivas. Esta forma de resolução de conflito tem se destacado como uma prática inovadora para acompanhar o desenvolvimento de obras, pois contribui para a minimização de disputas, promovendo a continuidade dos projetos e a redução de custos associados a litígios prolongados.

Com a contínua evolução do ambiente regulatório e o aumento das demandas por soluções sustentáveis, a arbitragem, então, estabelece-se não apenas como uma ferramenta de resolução de conflitos, mas também como um facilitador do desenvolvimento sustentável e da inovação no setor de energia. O fortalecimento do mercado de arbitragem no Brasil, aliado à adoção de práticas inovadoras como os Dispute Boards, posiciona o país como um líder na resolução eficiente e especializada de disputas no setor energético, promovendo um ambiente de negócios mais seguro e atraente para todos os stakeholders envolvidos.

spot_img

Artigos relacionados

ANEEL aprova revisão do Submódulo 9.4 do Proret com novos critérios para cálculo da...

Atualização incorpora critérios de alocação de pontos de conexão ao SIN, aumentando precisão no cálculo tarifárioA Agência Nacional...

CEBRI debate cooperação Brasil-Estados Unidos no G20 e lança dossiê estratégico

Evento reúne especialistas de importantes think tanks americanos para discutir temas globais como mudanças climáticas e transformação digitalO...

Form Energy Apresenta Baterias de Ferro-Ar como Solução para Redes Elétricas Resilientes

Form Energy apresenta tecnologia revolucionária para redes elétricas resilientes, seguras e acessíveisA transição para uma matriz elétrica limpa...

Delta Energia Anuncia Max Xavier Lins como Novo CEO e Foca no Crescimento Estratégico

Executivo com 40 anos de experiência assume a gestão operacional do grupo, enquanto fundadores focam em novos negócios...