Relatório do Tribunal de Contas da União indica que a diversificação da matriz elétrica com térmicas, eólicas e solares é o caminho mais seguro, mas neutralidade tecnológica ainda é desafio no setor
O papel das usinas termoelétricas na matriz elétrica brasileira voltou ao centro do debate público após a divulgação de uma análise aprofundada feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O estudo, apresentado na sessão plenária do dia 2 de abril de 2025, traz conclusões relevantes sobre os custos, viabilidade técnica e impactos ambientais do uso de térmicas, e aponta para a necessidade de maior diversificação e equilíbrio na composição da matriz energética nacional.
O processo integra o Acórdão 768/2025 – Plenário, sob relatoria do ministro Jorge Oliveira, e decorre do cumprimento das determinações previstas no Acórdão 4070/2020, relatado anteriormente pela então ministra Ana Arraes. A auditoria examinou de forma comparativa diferentes cenários de expansão da geração elétrica, com foco nos custos operacionais, investimentos e emissões de gases de efeito estufa.
Diversificação como estratégia de segurança energética
Entre as conclusões mais relevantes do relatório, está a constatação de que nenhuma fonte isolada, seja térmica, solar, eólica ou hidrelétrica, é capaz de garantir sozinha a segurança energética e a viabilidade econômica do sistema elétrico brasileiro. O cenário mais próximo da realidade prevista pelo Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) é aquele que combina fontes intermitentes (solar e eólica) com termoelétricas flexíveis.
“O cenário de expansão com fontes intermitentes e termelétricas é o mais viável, pois permite o atendimento da demanda de ponta e contribui com os critérios de segurança de suprimento”, afirmou o ministro Jorge Oliveira durante a leitura do voto. De acordo com o estudo, a presença das térmicas, apesar dos impactos ambientais, compensa a intermitência das renováveis, que são dependentes de condições climáticas.
Termoelétricas: solução com custo elevado e emissões
A análise também revelou que uma expansão baseada exclusivamente em termoelétricas movidas a gás natural, embora eficaz na garantia do suprimento, gera altos custos para o sistema e impactos ambientais consideráveis, especialmente pela emissão de dióxido de carbono (CO₂).
Por outro lado, o uso exclusivo de fontes renováveis intermitentes, como a solar e a eólica, exigiria o desenvolvimento de tecnologias de armazenamento ou o apoio de fontes firmes (como as próprias térmicas), o que aumentaria os custos operacionais e não asseguraria o abastecimento em momentos de baixa produção.
O estudo também descartou, ao menos por ora, a viabilidade de um cenário de expansão baseado exclusivamente em hidrelétricas. Segundo o TCU, além dos longos processos de licenciamento ambiental, há limitações físicas para a instalação de novas usinas em determinadas bacias hidrográficas. Ainda, os custos de capital (Capex) e operação e manutenção (O&M) são altamente variáveis, o que dificulta a previsibilidade de investimentos.
Neutralidade tecnológica: um objetivo distante
Outro ponto sensível identificado na auditoria diz respeito ao princípio da neutralidade tecnológica, que preconiza um ambiente regulatório que trate de forma equânime todas as fontes de geração elétrica, sem favorecimentos artificiais. O TCU reconhece avanços, mas conclui que esse princípio ainda não é plenamente aplicado no Brasil.
O relatório destaca políticas públicas e leilões de energia com condições diferenciadas para fontes específicas, além de legislações que impõem a contratação obrigatória de térmicas a gás, contrariando o conceito de competição justa entre as tecnologias.
“Há desafios importantes para avançar na neutralidade tecnológica, como a especificação dos requisitos sistêmicos e a precificação de atributos de cada fonte, algo que ainda carece de evolução regulatória”, pontuou o ministro Jorge Oliveira.
Caminhos para o futuro energético do Brasil
A análise do TCU reforça a necessidade de um planejamento energético com base em critérios técnicos, econômicos e ambientais. A combinação de fontes, com ênfase na flexibilidade e resiliência do sistema, aparece como a alternativa mais segura para o futuro.
Em meio ao processo de transição energética global, o Brasil precisa equilibrar sua vocação renovável com a responsabilidade de garantir fornecimento ininterrupto e tarifas justas. A discussão colocada pelo TCU é uma oportunidade para que o país avance em diretrizes mais coerentes com os desafios contemporâneos, sem abrir mão da sustentabilidade, mas também sem comprometer a segurança energética.