Estudo revela que riscos regulatórios e políticas públicas instáveis são os principais obstáculos para o avanço de projetos sustentáveis no Brasil
A transição energética é inevitável, e urgente. No entanto, no Brasil, a trajetória rumo a uma economia de baixo carbono ainda esbarra em entraves significativos, especialmente no campo regulatório. É o que mostra o estudo “Perspectivas de Investimento na Transição Energética: 2025 em diante“, conduzido pela KPMG com 1.400 executivos de 36 países, incluindo um recorte com 50 representantes brasileiros de 11 setores da economia.
De acordo com o levantamento, 36% dos entrevistados no Brasil apontam os riscos regulatórios e de políticas públicas como a principal barreira enfrentada durante o processo de transição energética. A constatação reforça um alerta já recorrente entre investidores e empresas: a instabilidade legislativa e a falta de previsibilidade política comprometem decisões de longo prazo, especialmente em setores com alto capital intensivo, como geração de energia solar, eólica, biocombustíveis e hidrogênio verde.
Segundo Nelmara Arbex, sócia-líder de ESG da KPMG para as Américas, mudanças repentinas nas diretrizes públicas podem inviabilizar projetos em estágio avançado de desenvolvimento, o que gera insegurança e reduz o apetite de investidores.
“Ambientes regulatórios estáveis, transparentes e consistentes são essenciais para garantir o fluxo de capital necessário à expansão da infraestrutura de energia limpa”, afirma Arbex. “Essa estabilidade não é importante apenas para o mercado interno, mas também para posicionar o Brasil como exportador de soluções energéticas sustentáveis.”
Crescimento previsto nos investimentos
Apesar do alerta quanto à regulação, o cenário é otimista no médio prazo. O estudo aponta que os investimentos em ativos de transição energética devem crescer de forma acelerada nos próximos dois anos, impulsionados por uma esperada redução nas taxas de juros, queda nos custos de materiais e políticas governamentais favoráveis.
64% dos entrevistados brasileiros disseram que pretendem focar em eficiência energética, enquanto 40% têm como prioridade o armazenamento de energia e a infraestrutura de rede — dois pilares fundamentais para garantir a estabilidade e a escalabilidade da matriz renovável nacional.
De acordo com Manuel Fernandes, sócio-líder do setor de Energia e Recursos Naturais da KPMG no Brasil e América do Sul, as oportunidades de investimento estão se diversificando rapidamente, o que favorece a entrada de novos players no mercado e amplia o potencial de inovação tecnológica.
“À medida que a transição energética acelera, aumenta a demanda por expansão da capacidade instalada de renováveis, modernização de redes e desenvolvimento de novas soluções de armazenamento”, explica Fernandes.
Motivações diversas entre investidores financeiros e operacionais
O estudo também investigou as razões que motivam diferentes tipos de investidores a escolherem ativos voltados à transição energética. Entre os investidores financeiros, o principal fator apontado foi o retorno monetário (48%), seguido pelo desenvolvimento tecnológico (35%).
Já entre os investidores operacionais, as motivações são mais variadas: 37% destacam a segurança ou independência energética, 33% mencionam o impacto social e outros 33% citam os custos da energia e pressões das partes interessadas como razões determinantes.
Esse panorama revela que, enquanto o mercado financeiro busca retorno, o setor produtivo vê a transição como uma questão estratégica de competitividade, reputação e resiliência.
Caminho exige colaboração entre setores
O sucesso da transição energética brasileira dependerá da atuação coordenada entre governo, empresas, sociedade civil e organismos reguladores. O país, que já conta com uma matriz energética relativamente limpa, precisa agora de um ambiente institucional robusto para sustentar o crescimento de projetos renováveis em larga escala.
Além disso, será fundamental garantir incentivos adequados, clareza nas regras, segurança jurídica e um planejamento de longo prazo que envolva também metas sociais e ambientais. Apenas assim o Brasil poderá cumprir sua ambição de se tornar referência global na nova economia de baixo carbono.