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Guerra de bastidores e judicialização fazem MME cancelar Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP)

Disputa entre interesses políticos e econômicos, envolvendo grandes grupos de biocombustíveis e gás natural, obriga o governo a recuar e reabrir consulta pública sobre regras do leilão de reserva de capacidade

O Ministério de Minas e Energia (MME) anunciou o cancelamento do Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP), previsto para acontecer em junho de 2025, em razão da crescente judicialização do processo. A decisão, publicada na Portaria Normativa nº 106 no Diário Oficial da União em 4 de abril, revoga outras quatro portarias anteriores — de números 96, 97, 100 e 103 — que estabeleciam as diretrizes do certame.

A medida evidencia o cenário de instabilidade regulatória que tem permeado o setor elétrico brasileiro, especialmente quando envolve disputas de interesses entre grandes players do mercado. Com o cancelamento, o governo pretende abrir uma nova consulta pública, desta vez com prazo mais curto para contribuições, visando rediscutir aspectos sensíveis das regras, como o chamado “fator a” — critério técnico de exequibilidade aplicado à contratação da disponibilidade de potência.

Embora o MME tenha sinalizado que a retomada será ágil, o cancelamento do leilão frustrou investidores e agentes do setor. A expectativa era de que o leilão ocorresse ainda em 2023, mas uma sucessão de adiamentos levou a publicação da portaria autorizativa apenas em janeiro de 2025 — para, poucos meses depois, ser oficialmente revogada.

O estopim para o cancelamento veio no início de março, quando a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) obteve decisão liminar na Justiça suspendendo o leilão. A argumentação da entidade era de que o governo deveria realizar consulta pública específica sobre o critério de exequibilidade técnica, o que não teria ocorrido de forma adequada até então.

Dois blocos em disputa: biocombustíveis e gás natural

Nos bastidores, a disputa judicial escancara um embate político e econômico entre dois grupos de peso. De um lado, representantes do setor de biocombustíveis, apoiados pela Frente Parlamentar Agropecuária, buscavam garantir contratos para termelétricas movidas anteriormente a óleo combustível, agora convertidas para o uso de insumos renováveis. De outro, gigantes do setor de gás natural — incluindo a Petrobras — tentavam assegurar espaço no mercado de fornecimento de potência elétrica.

O MME, ao perceber a possibilidade concreta de judicialização também dos resultados do leilão, decidiu evitar maiores danos à credibilidade institucional do processo e recuar. Fontes do setor ouvidas pela MegaWhat afirmam que, apesar da interrupção, não há risco de déficit de potência no curto prazo. No entanto, o adiamento traz impacto econômico direto: sem o contrato via leilão, as usinas existentes continuarão operando em regime merchant, ou seja, comercializando energia no mercado livre, o que tem custo mais elevado em comparação com os contratos de longo prazo.

Impactos e incertezas no horizonte

Além da frustração com a insegurança jurídica, há preocupações com a previsibilidade dos investimentos no setor. O LRCAP é um instrumento fundamental para garantir segurança energética no sistema interligado nacional, especialmente em momentos de alta demanda ou escassez de fontes renováveis, como no período seco. A incerteza regulatória, somada à instabilidade política entre os setores concorrentes, gera apreensão quanto à atratividade de novos projetos.

O produto de termelétrica existente com entrega prevista para setembro de 2025, por exemplo, poderá ser inviabilizado se a nova consulta pública atrasar ainda mais a realização do certame. Isso compromete o planejamento do setor, tanto no que diz respeito à expansão da oferta quanto ao controle de custos.

A situação reacende o debate sobre a necessidade de modernizar os mecanismos de contratação de energia no Brasil, de modo a torná-los mais transparentes, previsíveis e menos vulneráveis a pressões político-econômicas. A judicialização do LRCAP mostra que, além da regulação técnica, é preciso construir um ambiente institucional mais estável, capaz de garantir segurança jurídica para investimentos de longo prazo.

Enquanto o novo edital não é lançado, o setor observa com cautela os desdobramentos da nova consulta pública. A forma como o governo irá conduzir esse processo — ouvindo os diversos atores envolvidos e equilibrando interesses — será determinante para a credibilidade futura dos leilões de potência no Brasil.

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