Relatório global revela crescimento expressivo do financiamento em infraestrutura verde, com protagonismo de setores público e privado, e destaca oportunidades estratégicas para o Brasil
Os investimentos globais em soluções baseadas na natureza (SbNs) para segurança hídrica dobraram nos últimos 10 anos, atingindo US$ 49 bilhões em 2023. Esse é o principal dado revelado no relatório “Doubling Down on Nature: State of Investment in Nature-based Solutions for Water Security 2025”, produzido pela The Nature Conservancy (TNC) em parceria com a Forest Trends, consolidando a análise mais abrangente já feita sobre o tema, com dados de 140 países.
O levantamento demonstra que, embora o financiamento público ainda represente 97% do total investido, a participação do capital privado cresceu de forma expressiva — aumentou 30 vezes na última década, sinalizando que investidores, empresas e operadores de serviços públicos estão cada vez mais atentos ao potencial das SbNs como ferramentas essenciais para enfrentar os desafios climáticos e garantir a resiliência hídrica.
O estudo analisou 1.645 projetos globais, voltados à proteção de bacias hidrográficas, mitigação de riscos de inundações, melhoria da qualidade da água e preservação de ecossistemas. As iniciativas incluem desde recuperação de florestas e áreas de nascente até manejo de planícies aluviais e conservação de áreas naturais, compondo uma infraestrutura verde que complementa soluções tradicionais (infraestrutura cinza).
Crescimento global e destaque para mercados emergentes
Apesar de China, Estados Unidos e União Europeia responderem por 94% do investimento total entre 2013 e 2023, o crescimento mais acelerado foi observado na África, que multiplicou por cinco seus investimentos no período, impulsionada por recursos multilaterais e iniciativas públicas robustas.
Outras regiões também apresentaram avanços relevantes:
- América Latina e Caribe: crescimento de 2,6 vezes desde 2016, somando US$ 390 milhões em 2023, com forte participação de financiamentos multilaterais e domésticos.
- Ásia (excluindo China): aumento expressivo, com destaque para Japão, Índia, Vietnã e Coreia do Sul, que juntos representam 80% dos investimentos na região.
- Europa: investimento mais que dobrou desde 2016, chegando a US$ 10,8 bilhões, focado em controle de inundações e qualidade da água.
- Oceania: investimento triplicado desde 2013, com protagonismo de Austrália e Nova Zelândia, que unem inovação, liderança indígena e mecanismos de mercado.
Oportunidade estratégica para o Brasil
O relatório destaca que o Brasil tem enorme potencial para ampliar os investimentos em SbNs, especialmente nas ações de recuperação de bacias hidrográficas e expansão do saneamento básico. A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) projeta que serão necessários R$ 500 bilhões nos próximos 15 anos para universalizar o saneamento no país. Destinar uma fração desses recursos às SbNs poderia gerar benefícios significativos, tanto para garantir o abastecimento de água, quanto para fortalecer a resiliência climática e promover ganhos sociais e econômicos.
Samuel Barrêto, especialista da TNC Brasil, reforça: “O Brasil possui uma oportunidade única de integrar soluções baseadas na natureza às políticas de gestão hídrica e saneamento. Isso significa mais segurança hídrica para a população e sustentabilidade para os setores produtivos.”
Um exemplo bem-sucedido no país é o Fundo de Água de São Paulo, que protege e restaura quase 23 mil hectares em três bacias hidrográficas, contribuindo para o abastecimento de água de mais de 20 milhões de pessoas na Região Metropolitana. O projeto já mobilizou mais de R$ 29 milhões, integrando esforços dos setores público, privado e da sociedade civil.
Por que investir em SbNs?
A principal motivação dos investimentos em SbNs está na mitigação dos riscos de inundações, que têm se tornado mais frequentes e severas com as mudanças climáticas. Além disso, projetos de SbNs impactam diretamente na melhoria da qualidade da água, na redução de desastres naturais, na preservação da biodiversidade e no fortalecimento da economia local, sobretudo em áreas rurais e comunidades dependentes dos recursos hídricos.
Gena Gammie, diretora da Iniciativa Global de Água da Forest Trends, resume: “As soluções baseadas na natureza não são mais coadjuvantes. Elas são fundamentais para enfrentar os riscos hídricos e climáticos. Este relatório mostra que é hora de escalar essas soluções de forma urgente e inteligente.”
Desafios e próximos passos
Apesar dos avanços, o estudo alerta que é necessário acelerar a mobilização de investimentos, especialmente do setor privado. Para isso, recomenda-se:
- Fortalecer os modelos de receita resilientes;
- Criar incentivos financeiros claros;
- Estabelecer estruturas regulatórias robustas;
- Capacitar lideranças locais e comunidades;
- Promover maior integração entre infraestrutura verde e cinza.
O relatório completo está disponível no site da The Nature Conservancy Brasil, e traz insights valiosos para formuladores de políticas, empresas, investidores e a sociedade civil engajada na construção de um futuro hídrico mais seguro e sustentável.