Fernando Beltrame, CEO da Eccaplan, aponta que país tem oportunidade histórica para liderar transição global, mas alerta: discurso precisa se transformar em prática efetiva
Com a aproximação da COP 30, que será realizada em Belém (PA), o Brasil se encontra diante de uma oportunidade histórica para redefinir seu papel no cenário climático global. Detentor da maior biodiversidade do planeta, uma matriz energética relativamente limpa e um potencial reconhecido para a bioeconomia, o país pode assumir uma posição de liderança nas negociações ambientais internacionais. Mas, segundo Fernando Beltrame, CEO da Eccaplan e especialista em estratégias Net Zero, essa liderança só se concretizará com ações políticas estruturadas, investimentos em soluções sustentáveis e compromissos concretos.
“Receber a COP 30 é uma vantagem estratégica inquestionável, mas também traz à tona os desafios internos do Brasil. Temos biomas que capturam carbono, uma indústria de créditos de carbono em expansão e um histórico de energias renováveis. Porém, persistimos com altos índices de desmatamento, emissões crescentes e uma política pública que ainda não prioriza, com a urgência necessária, as ações sustentáveis”, afirma Beltrame.
Emissões preocupantes e o abismo entre discurso e prática
De acordo com dados do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa), em 2022 o Brasil emitiu cerca de 2,3 bilhões de toneladas de CO₂, sendo que 48% dessas emissões tiveram origem no desmatamento. O quadro revela a dicotomia entre o potencial de liderança ambiental e a realidade de práticas insustentáveis.
Beltrame defende que o país deve aproveitar a COP 30 para assumir compromissos audaciosos e viáveis, com foco em inovação, bioeconomia e inclusão social. “É hora de liderar não apenas pelo que somos, mas pelo que podemos construir: soluções replicáveis para o mundo, baseadas em nossas realidades e ativos ambientais”, enfatiza.
Ele destaca a necessidade de investimentos consistentes em economia circular, ampliação das metas de neutralização de carbono com critérios técnicos claros e, finalmente, a implementação integral da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que há mais de uma década aguarda efetividade plena.
O Brasil e o mercado global de compensação climática
Outro ponto central destacado pelo CEO da Eccaplan é o potencial do Brasil no mercado de compensação climática. Atualmente, o mercado voluntário de carbono movimenta mais de US$ 2 bilhões por ano globalmente, conforme dados do portal carboncredits.com. Para Beltrame, o Brasil pode e deve liderar esse setor, com projetos de alta integridade, alinhados à conservação de florestas e à geração de renda para comunidades locais.
“Na COP 30, teremos a chance de apresentar ao mundo um modelo de compensação climática justo, eficiente e com credibilidade”, aponta o especialista. O Brasil já possui iniciativas bem-sucedidas nesse campo, mas ainda carece de estrutura regulatória robusta e mecanismos de governança transparentes para consolidar sua posição de liderança.
O papel do setor privado e a corresponsabilidade climática
Além dos compromissos governamentais, Beltrame chama atenção para o papel fundamental do setor privado. “A agenda Net Zero não se faz só com discursos bonitos em eventos internacionais. É preciso mensurar, reduzir, compensar e comunicar com responsabilidade. Isso vale para governos, empresas e também para a sociedade civil”, reforça.
Segundo ele, a COP 30 deve marcar o início de um novo capítulo de corresponsabilidade ambiental no Brasil, com ações concretas, metas mensuráveis e participação ampla de diversos setores.
Expectativas para a COP 30: o maior evento climático do Brasil
A COP 30 será o maior evento climático já sediado pelo Brasil, com a expectativa de reunir líderes de mais de 190 países, representantes do setor empresarial, organizações sociais e ambientalistas de todo o mundo. O foco estará na implementação efetiva do Acordo de Paris, além do avanço em estratégias de adaptação e financiamento climático.
Beltrame avalia que a conferência pode ser o início de um novo ciclo, mas adverte: “Temos tudo para liderar. Falta, agora, vontade política e compromisso com a entrega”.
Desafios e oportunidade histórica
O Brasil se encontra, portanto, em um momento de encruzilhada. Pode optar por manter a atual trajetória de potencial subaproveitado, ou assumir definitivamente um papel de liderança ambiental, apresentando ao mundo soluções inovadoras e estratégias de mitigação e adaptação que combinem desenvolvimento econômico e preservação ambiental.
A realização da COP 30 em território nacional é a oportunidade de transformar o discurso climático em políticas públicas robustas, que coloquem o Brasil não apenas no centro das negociações, mas também no comando das soluções globais para a crise climática.