Brasil dá passo inédito rumo à autonomia na cadeia de terras raras com entrega de óxidos reciclados para projeto pioneiro do SENAI

Brasil dá passo inédito rumo à autonomia na cadeia de terras raras com entrega de óxidos reciclados para projeto pioneiro do SENAI

Primeira remessa de óxidos de terras raras obtidos por reciclagem de ímãs permanentes marca avanço estratégico na transição energética e no fortalecimento da indústria nacional

Em um movimento considerado estratégico para a soberania tecnológica e a sustentabilidade industrial do Brasil, foi realizada na última semana, em Lagoa Santa (MG), a entrega do primeiro lote de óxidos de terras raras reciclados, destinado ao projeto pioneiro conduzido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). A ação representa um marco histórico na construção de uma cadeia produtiva nacional integrada e sustentável, com impactos diretos sobre setores-chave como o de energia renovável, mobilidade elétrica e indústria eletrônica.

Fruto da parceria entre a Viridis Mineração Ltda e o SENAI, com apoio do Ministério de Minas e Energia (MME), a iniciativa impulsiona o desenvolvimento, no Brasil, das tecnologias necessárias para o refino de terras raras e a fabricação de ímãs permanentes — componentes indispensáveis para motores de veículos elétricos, turbinas eólicas, sensores e outros equipamentos eletrônicos.

A entrega dos óxidos reciclados resulta da coleta de ímãs usados em equipamentos descomissionados no Brasil, como aerogeradores, posteriormente enviados para reciclagem no centro tecnológico da Viridion Rare Earths Technologies, em Belfast, na Irlanda do Norte. A Viridion é uma joint venture entre a empresa brasileira Viridis Mineração Ltda e a australiana Ionic Rare Earths Ltd, especialista em tecnologias de reciclagem de terras raras.

Fechando o ciclo produtivo: inovação e sustentabilidade

De acordo com o CEO da Viridis, Klaus Petersen, a meta é transferir a tecnologia ao Brasil e fechar, no médio prazo, o ciclo produtivo completo dentro do território nacional, com destaque para Minas Gerais como um polo estratégico. “Estamos muito entusiasmados com a possibilidade de trazer essa tecnologia para o Brasil. A meta é fechar o ciclo produtivo no país, desde a mineração até a fabricação de ímãs”, afirmou.

A tecnologia empregada permite a recuperação de óxidos de terras raras com elevada pureza, utilizando resíduos industriais e reduzindo a dependência de mineração primária. O processo contribui para a constituição de uma cadeia produtiva mais limpa, eficiente e alinhada com os compromissos globais de descarbonização, fundamentais para enfrentar os desafios da transição energética.

Segundo Rodrigo Cota, diretor do Departamento de Transformação e Tecnologia Mineral da Secretaria Nacional de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do MME, a parceria com o SENAI viabiliza o desenvolvimento das tecnologias de refino de terras raras e de produção de ímãs permanentes no país. “A parceria das mineradoras de terras raras que operam no Brasil com o SENAI viabiliza o desenvolvimento no país das tecnologias de refino desses minerais e de produção de ímãs permanentes”, destacou.

Terras raras: elemento-chave da transição energética

As terras raras são um grupo de 17 elementos químicos essenciais para diversas tecnologias estratégicas, sobretudo aquelas relacionadas à transição para uma economia de baixo carbono. Subdivididos em leves — como o neodímio e o praseodímio — e pesados, como o disprósio e o térbio, esses elementos são imprescindíveis na fabricação de ímãs de alta performance utilizados em motores elétricos e turbinas eólicas, além de aplicações em eletrônicos de ponta.

Embora sejam chamados de “raros”, esses elementos são relativamente abundantes na crosta terrestre, mas raramente encontrados em concentrações que permitam sua exploração econômica. O Brasil se destaca nesse cenário como detentor da segunda maior reserva de terras raras do mundo, com 21 milhões de toneladas, o que corresponde a 23,3% das reservas globais, segundo dados oficiais.

Atualmente, o país possui uma mina em operação, localizada em Goiás, que iniciou atividades em 2023, e pelo menos 12 projetos pré-operacionais distribuídos nos estados da Bahia, Minas Gerais, Goiás, Tocantins e Amazonas. Esse potencial mineral, associado ao desenvolvimento de tecnologias de reciclagem e refino, posiciona o Brasil de maneira estratégica no cenário global da indústria de terras raras.

Demanda crescente e perspectivas para o Brasil

A importância das terras raras tende a crescer exponencialmente nas próximas décadas. Segundo projeções de mercado, a demanda total, que foi de 93 mil toneladas em 2023, deverá alcançar 169 mil toneladas até 2040. O uso associado à transição energética — veículos elétricos e turbinas eólicas — saltará de 16 mil toneladas em 2023 para 64 mil toneladas em 2040, um crescimento de 300%.

Esse cenário impõe desafios e oportunidades para países como o Brasil, que busca reduzir sua dependência de importações e aumentar sua autonomia tecnológica. A possibilidade de integrar toda a cadeia, desde a extração até a fabricação de componentes de alto valor agregado, é considerada fundamental para o fortalecimento da indústria nacional e para o cumprimento das metas de descarbonização assumidas internacionalmente.

Além disso, a reciclagem de ímãs permanentes se apresenta como uma alternativa estratégica e sustentável para complementar a oferta desses materiais, reduzindo o impacto ambiental associado à mineração e promovendo a economia circular no setor mineral.

Fortalecimento da indústria e da segurança energética

O desenvolvimento dessa cadeia produtiva integrada permitirá ao Brasil não apenas gerar valor agregado internamente, mas também fortalecer sua posição geopolítica como fornecedor estratégico de insumos críticos para a transição energética global.

A entrega simbólica realizada em Minas Gerais é, portanto, muito mais do que uma ação isolada: trata-se de um marco inaugural de uma nova etapa da indústria nacional, que alia inovação, sustentabilidade e soberania mineral.