Decisão da 8ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro cita violação à negociação coletiva e impõe à empresa o pagamento retroativo de salários, com multa diária por descumprimento
A 8ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, em decisão proferida no último dia 8 de abril, determinou a imediata reintegração de trabalhadores dispensados pela Eletronuclear e a suspensão do plano de demissões da empresa. A medida atende a uma ação movida por dois sindicatos da categoria, o SINTERGIA/RJ e o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Energia Elétrica de Paraty e Angra dos Reis, que questionam a legalidade das dispensas coletivas promovidas sem negociação prévia com as entidades representativas.
Segundo a juíza do trabalho Valeska Facure Pereira, responsável pela decisão, a dispensa em massa sem diálogo com os sindicatos fere diretamente o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 638 de repercussão geral, que estabelece como obrigatória a negociação coletiva prévia entre empresa e trabalhadores antes de desligamentos em larga escala.
A ação aponta que a Eletronuclear realizou demissões imotivadas em massa, o que foi corroborado por documentação apresentada à Justiça com diversas rescisões contratuais. Diante disso, a magistrada considerou presentes os requisitos legais para concessão de tutela provisória de evidência, o que permite a decisão antecipada mesmo sem a demonstração de risco imediato ou prejuízo irreversível, desde que haja verossimilhança nos argumentos e provas robustas.
Reintegração, pagamentos retroativos e multa diária
A Justiça determinou a reintegração dos empregados nas mesmas funções e cargos que ocupavam antes da dispensa, bem como o pagamento integral dos salários vencidos e vincendos desde a data da rescisão. Os valores deverão incluir todos os reajustes legais, convencionais ou espontâneos que tenham ocorrido no período.
A decisão também estipula multa diária de R$ 500 por trabalhador, caso a empresa não cumpra a reintegração nos moldes estabelecidos. A Eletronuclear terá prazo de cinco dias para comprovar a execução da ordem judicial.
Apesar da preocupação manifestada pelos sindicatos quanto ao possível impacto da redução de pessoal na segurança operacional das usinas nucleares Angra 1 e Angra 2, a juíza indeferiu o pedido de apresentação de plano de contingência por parte da empresa, por entender que não foram apresentados indícios suficientes para justificar essa exigência no momento.
Negociação coletiva em pauta
O pano de fundo da decisão é a relevância da negociação coletiva em processos de reestruturação de empresas públicas e privadas, sobretudo em setores estratégicos como o de energia. O STF já havia firmado entendimento de que a dispensa em massa exige o envolvimento dos sindicatos para preservar direitos e evitar impactos sociais desproporcionais.
No caso da Eletronuclear, que tem sob sua responsabilidade a geração de energia nuclear no Brasil e integra a holding ENBPar (Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional), as demissões foram interpretadas como violação direta à liberdade sindical e ao processo de negociação coletiva, especialmente porque há um dissídio coletivo em curso entre empresa e trabalhadores.
A decisão da 8ª Vara do Trabalho pode ter repercussões importantes no setor elétrico brasileiro, já que evidencia o rigor com que o Poder Judiciário vem tratando casos de demissão em massa sem o devido processo negocial.
Desdobramentos esperados
A Eletronuclear ainda pode recorrer da decisão, mas, enquanto isso, está obrigada a cumprir integralmente as medidas determinadas pela Justiça. A expectativa é de que a empresa, diante da imposição judicial e da multa estipulada, busque retomar as negociações com os sindicatos e ajustar seu plano de pessoal às normas coletivas.
Para o setor de energia, o caso reitera a importância da gestão estratégica de recursos humanos em contextos de transição, reestruturação ou corte de gastos, respeitando o equilíbrio entre a eficiência operacional e os direitos trabalhistas fundamentais.