Por Paulo Toledo, CO-CEO e fundador da Ecom
Nos últimos anos, tenho observado a crescente volatilidade no mercado de energia e como isso impacta toda a cadeia do setor, dos consumidores aos grandes investidores. Recentemente, li o artigo “Sete áreas em que a IA pode aumentar a eficiência no mercado de energia”, do Raphael Saueia Bueno, e alguns pontos me chamaram a atenção. A dinâmica atual, aliada à maior complexidade do mix energético e às demandas cada vez mais urgentes por sustentabilidade, torna a inteligência artificial uma aliada estratégica para lidar com incertezas e acelerar processos de tomada de decisão.
É nesse contexto que surge a IA como uma solução poderosa para enfrentar desafios de volatilidade, de previsibilidade de preços e de busca por fontes renováveis. Afinal, estamos falando de um mercado em que cada decisão precisa considerar clima, regulação, geopolítica, padrões de consumo e uma série de outras variáveis.
Mais do que substituir o trabalho humano, ela funciona como uma extensão analítica que aprimora processos, tornando-os mais ágeis e precisos. Em minha experiência à frente da Ecom vejo cada vez mais oportunidades de usar algoritmos preditivos, modelos de linguagem natural e ferramentas de Big Data para otimizar não só os resultados financeiros, mas também a sustentabilidade de longo prazo.
Abaixo, destaco três pontos que a IA está transformando o setor:
1. Previsão de preços e análise de volatilidade
A energia é um produto único: seus preços variam de acordo com fatores como clima, disponibilidade de fontes, políticas governamentais e até eventos geopolíticos. A IA, por meio de algoritmos de machine learning e análise de Big Data, é capaz de processar grandes quantidades de informações sobre históricos de preços, eventos climáticos e variáveis macroeconômicas, identificando padrões e correlações que muitas vezes passariam despercebidos.
A análise automatizada de dados amplia a capacidade de prever oscilações de curto e médio prazos, permitindo que as mesas de comercialização se adaptem a variações bruscas. Já presenciei casos em que esse tipo de previsão ofereceu vantagens competitivas, garantindo margens melhores nas negociações e contribuindo para a segurança de abastecimento.
É importante ressaltar que a IA não toma essas decisões de forma totalmente independente. Ela oferece insights valiosos, mas cabe a profissionais especializados — como traders, analistas de risco e gestores de portfólio — interpretá-los e definir estratégias de ação. É o equilíbrio entre tecnologia e olhar humano que resulta em decisões robustas.
2. Previsão de demanda e padrões de consumo
Outro grande desafio do setor de energia é prever a demanda, que varia conforme condições climáticas, atividades industriais, tendências sociais e até mesmo feriados prolongados. Errar nessa estimativa pode significar prejuízos significativos, seja por falta de energia disponível ou por excedentes que não encontram comprador.
Com a inteligência artificial, conseguimos mapear esses fatores e atualizar as projeções de forma contínua. Sistemas de IA podem correlacionar dados históricos de consumo com previsões meteorológicas e hábitos de consumo, identificando padrões de uso muito específicos. Na prática, isso pode se traduzir em estratégias mais eficientes de alocação de recursos, evitando desperdícios e garantindo a disponibilidade de energia nos horários de pico.
Do ponto de vista do consumidor, essa tecnologia também traz benefícios em termos de eficiência energética. Já existem iniciativas em que as concessionárias oferecem descontos para quem consome energia fora do horário de pico, incentivando mudanças de comportamento que reduzam os custos globais e a pressão sobre a rede. Nesse sentido, a IA permite não só prever, mas também influenciar a demanda, apontando caminhos para um consumo mais inteligente e sustentável.
3. Gestão de riscos e otimização de investimentos em renováveis
O terceiro ponto que considero essencial é a capacidade de a IA lidar com riscos e auxiliar na otimização de investimentos, especialmente em fontes renováveis. A transição para energias limpas é uma realidade irreversível, mas ainda carrega incertezas sobre regulamentação, disponibilidade de incentivos e viabilidade econômica a médio e longo prazos.
Ferramentas de IA podem ajudar a construir cenários que levam em conta variáveis como políticas ambientais, previsões de emissão de carbono, custos de implantação de novas tecnologias e até aceitação social. Quando pensamos em projetos de grande escala, como parques solares ou eólicos, ter simulações detalhadas de produção, levando em consideração questões climáticas e logísticas, é fundamental para reduzir riscos de investimento.
A IA também desempenha papel relevante na análise de cenários de risco em processos de comercialização de energia, pois simula fatores como mudanças regulatórias e eventos geopolíticos, que podem impactar diretamente o valor de cada contrato. Dessa forma, as empresas ficam mais preparadas para eventos inesperados, adotando estratégias de hedge e diversificação de portfólio que suavizam os efeitos de crises pontuais.
Sendo assim, minha visão é clara: a Inteligência Artificial não é um substituto para o trabalho humano, mas sim uma ferramenta de apoio estratégico. Ela permite que os profissionais foquem em atividades de maior valor agregado, enquanto os algoritmos cuidam de tarefas mais repetitivas e da análise de dados em larga escala. Ao integrar a IA com processos de gestão bem estruturados e orientados para a sustentabilidade, conseguimos não só melhorar resultados financeiros, mas também fortalecer o compromisso do setor com o meio ambiente e com as demandas sociais.
Acredito que estamos apenas no começo de uma verdadeira revolução no setor de energia, em que a IA se mostra um pilar fundamental para a previsão de preços, a otimização de demanda e a gestão de riscos em investimentos renováveis. Em um cenário tão dinâmico, quem souber aproveitar as oportunidades trazidas pela inteligência artificial terá não só vantagens competitivas imediatas, mas também a chance de liderar o caminho rumo a um mercado de energia mais eficiente, resiliente e sustentável.