Apesar de leve redução em 2023, consumidores ainda destinam quase metade do valor pago a tributos e encargos setoriais; desigualdades regionais e mudanças legislativas são fatores de alerta para o setor
Um estudo realizado pela PwC, em parceria com o Instituto Acende Brasil, revelou que 46,2% do total das contas de energia elétrica no Brasil em 2023 foram destinados a tributos e encargos setoriais. Embora tenha havido uma pequena redução em relação aos 48,1% registrados em 2022, o peso desses custos permanece significativo, destacando a complexidade fiscal do setor elétrico brasileiro e os desafios associados à regulação tributária.
O levantamento utilizou dados de empresas que representam cerca de 70% do mercado nacional de geração, transmissão e distribuição de energia, analisando sete tributos (federais, estaduais e municipais) e onze encargos setoriais. A arrecadação consolidada atingiu impressionantes R$ 107,9 bilhões, dos quais 31% correspondem a tributos e 15,2% a encargos. Esses números, apesar de apontarem para uma tendência de estabilidade nos encargos, expõem uma questão que vai além dos números: a necessidade de um sistema mais eficiente e menos oneroso para consumidores e empresas.
A leve redução observada na carga tributária foi impulsionada, principalmente, pela implementação da Lei Complementar nº 194/2022, que classificou a energia elétrica como um bem essencial, limitando as alíquotas de ICMS ao patamar geral de cada estado. Essa medida trouxe alívio parcial para os consumidores, mas revelou disparidades regionais. Enquanto estados como São Paulo e Minas Gerais mantiveram alíquotas próximas de 18%, a Bahia, por exemplo, aumentou a carga efetiva para impressionantes 37%, incluindo tributos embutidos no preço final da energia para consumidores residenciais. No Rio de Janeiro, a taxa subiu de 18% para 22%, evidenciando a falta de uniformidade nas políticas estaduais.
Os encargos setoriais, por sua vez, permaneceram estáveis, representando 15,2% da arrecadação total. Entre eles, a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) foi o maior destaque, sendo responsável por 12,9% do total arrecadado. Embora essenciais para financiar subsídios e políticas de universalização do serviço, esses encargos geram discussões sobre sua gestão e os impactos no custo final para o consumidor.
A Reforma Tributária e o Futuro do Setor
Outro ponto de atenção levantado pelo estudo é o impacto da Reforma Tributária em tramitação no Congresso Nacional. Alterações previstas na base de cálculo do ICMS, a possibilidade de tributação sobre o uso do sistema de transmissão e distribuição (TUST/TUSD), e a ampliação de subsídios a fontes alternativas de energia estão no radar de especialistas. Essas mudanças podem tanto aliviar quanto agravar os desafios fiscais do setor, dependendo de como forem implementadas.
Eduardo Müller Monteiro, diretor executivo do Instituto Acende Brasil, reforçou a importância de previsibilidade no ambiente regulatório para evitar impactos negativos no planejamento estratégico das empresas. “A Lei Complementar nº 194/2022 já trouxe mudanças importantes, mas a carga tributária do setor ainda é alta e precisa ser monitorada. O diálogo constante entre governo, empresas e consumidores será fundamental para garantir a competitividade e a sustentabilidade do setor elétrico brasileiro”, afirmou.
O estudo também destaca a necessidade de acompanhar os desdobramentos da chamada “dívida regulatória”. Esse conceito engloba subsídios tarifários e políticas de incentivo à sustentabilidade energética, muitas vezes financiados por empresas e estados. A forma como esses subsídios são estruturados pode gerar pressões adicionais sobre as tarifas de energia e criar desigualdades regionais ainda maiores.
Desafios Regionais e as Perspectivas para 2024
As desigualdades regionais continuam a ser um problema significativo. A aplicação das alíquotas estaduais de ICMS de forma diferenciada cria um cenário em que o custo da energia varia amplamente entre as regiões. Estados que aumentaram suas alíquotas, como a Bahia, têm visto um impacto desproporcional nas contas de energia de seus consumidores.
Para 2024, o estudo projeta possíveis alterações na carga tributária. De um lado, espera-se que as reduções das alíquotas de ICMS continuem a beneficiar alguns estados. Por outro, há a preocupação com novos fatores que podem aumentar os custos, como a tributação sobre o uso de sistemas de transmissão e distribuição e a ampliação de subsídios a fontes alternativas de energia.
Embora a redução na carga tributária em 2023 seja um passo positivo, especialistas alertam que o setor elétrico ainda precisa enfrentar questões estruturais para garantir um sistema mais justo e eficiente. “Estabilidade regulatória e previsibilidade são fundamentais para evitar surpresas e criar um ambiente favorável ao desenvolvimento do setor”, concluiu Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil.