Coalizão Financeira BRB apresenta caminhos para superar entraves e atrair investidores para projetos sustentáveis na Amazônia e outros biomas brasileiros
A restauração florestal, a bioeconomia e a agricultura regenerativa no Brasil avançam como alternativas concretas e escaláveis no enfrentamento às mudanças climáticas, no fortalecimento de comunidades locais e na preservação da biodiversidade. Contudo, transformar esse potencial em projetos de grande escala capazes de atrair capital privado ainda é um dos principais desafios do setor.
Essa foi a tônica do debate ocorrido durante o painel “Destravando investimentos privados para bioeconomia, restauração e agricultura regenerativa: o caminho para a COP 30”, realizado no dia 27 de maio, no II Fórum Brasileiro de Finanças Climáticas e de Natureza, no Rio de Janeiro.
O encontro reuniu especialistas e representantes da Coalizão Financeira para Restauração e Bioeconomia do Brasil (BRB FC), uma iniciativa lançada em novembro de 2023, durante o G20, que visa mobilizar até US$ 10 bilhões até 2030 para projetos de restauração florestal e desenvolvimento de bioeconomia de base comunitária. A longo prazo, a meta da Coalizão inclui ainda a redução de uma gigatonelada de carbono até 2050.
Superando barreiras financeiras e estruturais
Durante o painel, Gabriel Azevedo, diretor-gerente de ESG no IDB Invest, foi enfático ao destacar os entraves que dificultam a atração de investimentos privados para projetos sustentáveis no Brasil. Segundo ele, embora haja uma percepção crescente sobre a importância de iniciativas de bioeconomia e restauração, ainda persiste uma série de gargalos estruturais.
“Estamos falando de algo que tem potencial para mudar estruturalmente o sistema econômico e ambiental. Há muitas boas intenções, mas poucos projetos conseguem atingir o grau de maturidade necessário para acessar capital privado. Isso se dá, principalmente, pela falta de estrutura financeira, governança robusta e clareza regulatória”, afirmou Azevedo.
Na avaliação do especialista, o mercado financeiro tradicional ainda não desenvolveu ferramentas adequadas para mensurar e precificar os riscos associados a esse tipo de projeto. “O pessoal de risco não sabe como analisar uma proposta baseada na natureza. Somos pioneiros, estamos lidando com um modelo que nunca foi feito antes”, acrescentou.
Um mercado em transformação e urgente
A necessidade de alinhar interesses financeiros, ambientais e sociais é uma das grandes pautas da BRB FC, que já reúne 21 membros, entre investidores, empresas, organizações da sociedade civil, lideranças indígenas e órgãos públicos, tanto do Brasil quanto do exterior.
A BRB FC tem um papel articulador, buscando construir pontes entre os proponentes dos projetos — frequentemente, comunidades locais, povos indígenas e organizações de base — e o capital privado interessado em investir em soluções sustentáveis.
“A Coalizão pode e deve continuar pressionando para que os modelos de financiamento se adaptem às realidades da restauração florestal e da bioeconomia. Isso não é só uma demanda brasileira ou latino-americana. É uma agenda global, de interesse comum para enfrentar as mudanças climáticas”, reforçou Azevedo.
Dados que comprovam o potencial e a urgência
No mesmo painel, Karen Oliveira, diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da The Nature Conservancy (TNC), apresentou os primeiros resultados do estudo “Mapeamento de Empreendimentos de Povos Indígenas e Populações Tradicionais, Fundos Comunitários e Organizações Facilitadoras”.
A pesquisa faz um levantamento inédito sobre como essas comunidades acessam financiamento e quais são os principais gargalos enfrentados. O estudo também revela que há uma oportunidade concreta para acelerar investimentos diretamente em negócios e projetos liderados por povos indígenas e populações tradicionais.
“Estamos falando de soluções que já existem, que são efetivas, mas que precisam de apoio financeiro adequado. As linhas de financiamento tradicionais não cobrem custos essenciais para a operação e o fortalecimento dessas iniciativas”, destacou Karen.
Dentro da meta de US$ 10 bilhões até 2030, a Coalizão prevê que pelo menos US$ 500 milhões sejam destinados diretamente para empreendimentos liderados por comunidades indígenas e tradicionais na Amazônia e outros biomas brasileiros.
Rentabilidade com impacto socioambiental
Uma das premissas fundamentais da BRB FC é demonstrar que é possível gerar retorno financeiro ao mesmo tempo em que se promove a restauração ambiental, o desenvolvimento econômico local e a conservação da biodiversidade.
“A missão, por si só, não move o investidor. Precisamos estruturar projetos que garantam rentabilidade, redução de riscos e geração de impacto positivo. É um novo paradigma que estamos construindo”, reforçou Gabriel Azevedo.
Esse novo paradigma exige, no entanto, que os próprios instrumentos financeiros sejam revistos, adaptados e inovadores. Modelos como blended finance, fundos garantidores, seguros específicos e métricas robustas de impacto são alguns dos caminhos apontados pelos especialistas como essenciais para destravar o capital.
Desafio rumo à COP 30 e além
O painel reforçou que o caminho para a COP 30, que ocorrerá em 2025 em Belém (PA), passa necessariamente pela consolidação de soluções financeiras capazes de viabilizar a bioeconomia em larga escala.
Alessandra Fajardo, conselheira sênior para a COP-30 no Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), destacou que o Brasil tem uma oportunidade histórica de liderar a agenda de finanças climáticas e soluções baseadas na natureza.
“A regeneração de cinco milhões de hectares de florestas não é só uma meta ambiental, é também uma estratégia econômica e social. Isso tem impacto na geração de empregos, na segurança climática e na valorização de ativos naturais que são únicos no mundo”, afirmou Alessandra.
Um movimento coletivo e global
O avanço da Coalizão Financeira para Restauração e Bioeconomia do Brasil demonstra que o desenvolvimento sustentável, longe de ser uma utopia, já é uma realidade possível — desde que os instrumentos de financiamento sejam adequados, que haja segurança jurídica e que os riscos sejam corretamente dimensionados.
Ao mesmo tempo, fica claro que esse é um esforço coletivo, que precisa da participação ativa de governos, setor privado, comunidades locais e da sociedade civil.
O Brasil, com sua riqueza natural incomparável e uma das maiores reservas de biodiversidade do planeta, tem o potencial de ser protagonista na construção de uma nova economia — uma economia regenerativa, inclusiva e resiliente.