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Câmara debate impactos de hidrelétricas, petróleo e renováveis em terras indígenas

Câmara debate impactos de hidrelétricas, petróleo e renováveis em terras indígenas

Audiência pública expõe as tensões entre expansão energética e a proteção de povos originários, com foco em salvaguardas ambientais e direitos constitucionais

A Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais da Câmara dos Deputados promoveu nesta terça-feira (8) uma audiência pública para discutir os impactos da geração de energia, em suas diversas formas, sobre terras indígenas no Brasil. A iniciativa partiu da deputada federal Célia Xakriabá (Psol-MG), uma das principais vozes do Congresso na defesa dos direitos dos povos originários. O evento foi realizado no Plenário 12 da Casa e reuniu representantes de ministérios, organizações indígenas e entidades ambientais.

A proposta da audiência foi analisar de forma crítica o avanço de empreendimentos energéticos, como hidrelétricas, parques eólicos, usinas solares e até a exploração de petróleo, sobre territórios indígenas. Segundo a deputada, o objetivo central é “avançar na regulamentação de salvaguardas efetivas aos povos indígenas diante do crescimento do setor energético no país”.

Tensão entre expansão energética e direitos indígenas

Durante o encontro, foram debatidos projetos de exploração de combustíveis fósseis em terras indígenas, como o da Petrobras na Bacia da Foz do Rio Amazonas. Célia destacou que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) já negou licença para essa operação, citando a falta de garantias em caso de acidente ambiental. “O Ibama apontou que não há salvaguardas para a fauna e para os povos indígenas do Oiapoque em caso de derramamento de óleo”, lembrou a deputada.

Célia Xakriabá também destacou que os povos indígenas são favoráveis à descarbonização da matriz energética brasileira, mas alertou: “As soluções propostas não podem ser mais um mecanismo de violação de direitos humanos”. A parlamentar citou os impactos históricos das grandes usinas hidrelétricas, como as construídas no rio São Francisco, que causaram alagamentos e deslocamentos forçados de comunidades indígenas desde 2012.

Energia “limpa”, impactos reais

Contrariando o senso comum de que as fontes renováveis são ambientalmente neutras, representantes indígenas relataram diversos impactos associados às usinas eólicas e solares instaladas próximas às aldeias. Entre os principais problemas citados estão o aumento da temperatura média dos rios, a redução da fauna aquática e polinizadora (peixes e abelhas), perda de áreas de criação de animais, especulação imobiliária, desmatamento e, sobretudo, o desequilíbrio na saúde mental das comunidades afetadas.

“Além de comprometer nosso território físico, esses empreendimentos destroem nossos lugares sagrados e nossas referências culturais. Isso tem causado aumento de casos de depressão e ansiedade entre nossos jovens”, afirmou Dinamam Tuxá, representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).

Acordo de Paris e mineração

Outro tema discutido foi o avanço da mineração em regiões próximas e, em alguns casos, dentro de terras indígenas. Com a crescente demanda por lítio e outros minerais essenciais à transição energética, cresce também a pressão sobre os territórios originários.

Célia Xakriabá lembrou que o Acordo de Paris, do qual o Brasil é signatário, determina que os países signatários devem conservar e fortalecer os sumidouros naturais de carbono, como as florestas. “Esses territórios são salvaguardados pelos povos indígenas, que são os verdadeiros guardiões da biodiversidade e do clima”, ressaltou.

Representatividade e convergência de vozes

Estiveram presentes na audiência representantes de importantes instituições governamentais e da sociedade civil: Bruno Potiguara, do Ministério dos Povos Indígenas (MPI); Cláudia Regina de Pinho, do Ministério do Meio Ambiente (MMA); Nicole Oliveira (Instituto Arayara); Carolina Marçal (ClimaInfo); e lideranças regionais como Kretã Kaingang (ARPINSUL) e Paulo Tupinikim (APOINME).

A diretora do Departamento de Gestão Socioambiental do MMA destacou que é urgente a construção de um modelo energético que reconheça os limites ecológicos e os direitos constitucionais dos povos tradicionais. “A transição energética precisa ser justa, inclusiva e dialogada”, afirmou.

Caminhos para uma transição energética com justiça social

O debate escancarou a necessidade de o Brasil conciliar seus objetivos de expansão energética com o respeito aos direitos originários. A ausência de uma legislação clara que regulamente salvaguardas específicas para os povos indígenas frente a empreendimentos energéticos foi apontada como uma lacuna grave.

Para Célia Xakriabá, a audiência é apenas o início de uma agenda que precisa ser permanente. “Queremos que a transição energética ocorra com justiça, e não às custas do nosso povo. Energia limpa não pode ser sinônimo de apagamento cultural.”

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