Empresa é penalizada por permitir turnos com operadores desacompanhados em alta tensão, decisão alcança diversas unidades no estado de São Paulo
Após um processo que durou uma década, a Justiça do Trabalho determinou, em caráter definitivo, que a Furnas Centrais Elétricas, subsidiária da Eletrobras, adote medidas rigorosas para garantir a segurança dos trabalhadores em suas subestações. A condenação foi motivada por práticas inseguras nas operações de alta tensão, expondo funcionários a riscos de acidentes graves, especialmente ao permitir turnos de trabalho com operadores desacompanhados. A decisão é válida para as centrais elétricas de Araraquara, Cachoeira Paulista, Campinas, Guarulhos, Itaberá e Tijuco Preto, no estado de São Paulo.
De acordo com a sentença, que foi mantida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) sob a relatoria do ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, a empresa deverá garantir a presença de pelo menos três operadores em cada subestação em todos os turnos. Caso contrário, estará sujeita a uma multa diária de R$ 50 mil. A decisão vem após uma investigação iniciada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em 2014, na qual o órgão constatou a prática de permitir operadores sozinhos em turnos noturnos, contrariando a Norma Regulamentadora nº 10, que exige a presença mínima de três profissionais em áreas energizadas.
Contexto da Condenação
O processo contra a Furnas teve início em 2014, quando o MPT, representado pelo procurador Rafael de Araújo Gomes, entrou com uma ação após conduzir um inquérito que confirmou as práticas inseguras da empresa. A investigação revelou que, especialmente nos turnos da madrugada, era comum que apenas um operador estivesse presente nas subestações para a realização de manutenções e verificações em redes de alta tensão.
A Norma Regulamentadora nº 10, estabelecida para garantir a segurança em ambientes de trabalho que envolvem eletricidade, proíbe que trabalhadores fiquem sozinhos em áreas de alta tensão. Em casos de choque elétrico ou outra emergência, a ausência de uma equipe de apoio impossibilitaria o socorro imediato ao operador, o que poderia resultar em acidentes fatais. A norma exige a presença mínima de três pessoas, permitindo a execução de manutenções com o suporte necessário para situações emergenciais.
Segundo o procurador Rafael de Araújo Gomes, o problema decorre da insuficiência de funcionários nas subestações, dificultando a cobertura em casos de afastamentos para treinamentos, licenças médicas ou outras eventualidades. “Embora a fiscalização não tenha constatado que o trabalho desacompanhado, inclusive com circulação em áreas energizadas com enorme risco, não seja diário, ficou constatado que ele não é excepcional ou imprevisível. Pelo contrário, ocorre periodicamente, diversas vezes ao ano, permanecendo o trabalhador vários dias seguidos sozinho, sem ninguém para socorrê-lo na hipótese de ocorrer algum acidente ou situação de urgência”, explicou o procurador.
Situação Observada nas Subestações
Durante as inspeções conduzidas por auditores fiscais, verificou-se que as condições de trabalho em algumas subestações eram alarmantes. Em situações de operação regular, um operador permanecia na cabine de controle, enquanto o outro realizava manutenções e inspeções físicas em instalações de alta tensão, de até 500 kV, muitas vezes desacompanhado. Esse cenário, segundo o relatório do Ministério do Trabalho e Emprego, expõe os funcionários ao risco constante de choques elétricos e à possibilidade de ocorrência de arcos voltaicos, um fenômeno que pode resultar em queimaduras graves e até mesmo mortes.
A fiscalização revelou ainda que, em caso de descumprimento de procedimentos ou falhas, o risco de acidentes era elevado, colocando em evidência a importância de um quadro completo de funcionários para garantir a segurança no local de trabalho. Os auditores enfatizaram que a manutenção adequada e o monitoramento constante de áreas energizadas são cruciais para evitar acidentes em operações com eletricidade.
Tentativa de Acordo Extrajudicial e Decisão Judicial
Antes de ingressar com a ação civil pública, o MPT ofereceu a Furnas a possibilidade de firmar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) para que a empresa se adequasse voluntariamente às normas de segurança estabelecidas pela NR-10. No entanto, a empresa recusou a assinatura do acordo, optando por não atender às exigências propostas. Essa negativa levou o MPT a buscar uma solução judicial, resultando na condenação de Furnas em todas as instâncias.
A decisão da 1ª Vara do Trabalho de Araraquara, agora mantida pelo TST, impõe uma multa diária de R$ 50 mil em caso de descumprimento da sentença, uma penalidade significativa que visa garantir a conformidade com as normas de segurança.
Impacto da Decisão no Setor Energético
A condenação de Furnas representa um marco para o setor elétrico brasileiro, sinalizando a importância do cumprimento das normas de segurança e a responsabilidade das empresas em proteger a vida de seus trabalhadores. Para o setor de energia, a decisão destaca a necessidade de adequação às regulamentações de segurança ocupacional e de investimento em pessoal para garantir operações seguras e sustentáveis.
Especialistas em segurança do trabalho apontam que, em um contexto de alta tensão, negligências podem ter consequências devastadoras. O caso de Furnas serve como alerta para empresas que operam com redes elétricas sobre a relevância do cumprimento rigoroso das normas regulamentadoras.
Para os trabalhadores, a decisão representa uma conquista, garantindo que operadores não sejam expostos a riscos desnecessários em subestações e que sejam acompanhados por uma equipe durante a execução de atividades em áreas energizadas. Segundo o MPT, o resultado da ação judicial estabelece um precedente importante para garantir ambientes de trabalho mais seguros no setor elétrico, especialmente para os que atuam na linha de frente em atividades de alta periculosidade.
Com essa condenação, Furnas terá de reformular a gestão de seus recursos humanos para assegurar que cada subestação tenha a quantidade mínima de operadores nos turnos, independentemente de eventuais ausências. Essa adequação, além de prevenir acidentes, fortalece a cultura de segurança no ambiente de trabalho, alinhando a empresa com as melhores práticas do setor.