Home Armazenamento de Energia Chile inaugura maior parque de baterias da América Latina e evidencia atraso...

Chile inaugura maior parque de baterias da América Latina e evidencia atraso regulatório do Brasil em armazenamento de energia

Chile inaugura maior parque de baterias da América Latina e evidencia atraso regulatório do Brasil em armazenamento de energia

Instalação de 200 MW em sistemas de armazenamento no deserto do Atacama evidencia a lacuna regulatória brasileira e reacende o debate sobre modernização da matriz energética nacional

Em um movimento estratégico que reforça sua posição de liderança em inovação energética na América Latina, o Chile inaugurou nesta quinta-feira (24) um dos maiores parques de baterias da região. A iniciativa, conduzida pela Atlas Renewable Energy, marca a instalação de 200 MW em sistemas de armazenamento de energia elétrica (BESS – Battery Energy Storage System) no deserto do Atacama, região que abriga também a maior concentração de geração solar do país.

O empreendimento está localizado no município de María Elena, na região de Antofagasta, e foi concebido para operar de forma complementar ao parque solar existente. As baterias foram projetadas para armazenar 800 MWh de energia entre 11h e 15h, período de maior geração solar, e injetar essa energia na rede entre 20h e 00h, justamente quando não há incidência solar e a demanda por eletricidade aumenta. Essa estratégia contribui para o melhor aproveitamento da geração intermitente e reduz perdas que ocorreriam pela limitação de escoamento nas linhas de transmissão.

Segundo o governo chileno, a inauguração antecipa em cinco anos a meta nacional de atingir 2 GW de capacidade instalada em sistemas de armazenamento, previsão antes projetada apenas para 2030. Com os novos 200 MW adicionados pela Atlas, o Chile passa a contar com 1,15 GW de BESS instalados, consolidando-se como o país latino-americano com maior avanço nesse tipo de tecnologia.

Investimento e inovação

O investimento total da Atlas Renewable Energy para a implementação do projeto foi de US$ 250 milhões, equivalente a cerca de R$ 1,4 bilhão. A energia armazenada será comercializada com a Copec Emoc, empresa chilena do setor de combustíveis e energia, e parte da eletricidade será utilizada na frota de ônibus elétricos da região, promovendo mobilidade limpa e sustentável.

Apesar de estarem localizadas próximas ao parque solar, as baterias foram conectadas diretamente à rede elétrica, e não às placas solares. Essa escolha permite que os sistemas operem mesmo em períodos nublados ou noturnos. A conexão com o parque solar serve apenas para alimentar componentes auxiliares dos BESS.

O ministro de Energia do Chile, Diego Pardow Lorenzo, destacou que a queda no preço das baterias e a agilidade na aprovação regulatória foram determinantes para o sucesso do projeto. Segundo ele, o país conseguiu, por meio de uma legislação clara e flexível, definir regras para operação, despacho e comercialização da energia armazenada. Pardow acredita que tecnologias como as baterias serão fundamentais para garantir maior estabilidade no sistema, especialmente diante da crescente participação de fontes intermitentes como solar e eólica.

Brasil estagnado sem regulação

Enquanto o Chile celebra avanços significativos na modernização da sua matriz energética, o Brasil ainda não possui regulamentação específica para sistemas de armazenamento em larga escala. A ausência de diretrizes claras tem sido apontada por especialistas como o principal obstáculo à implementação de projetos semelhantes no território nacional.

Fábio Bortoluzo, gerente-geral da Atlas no Brasil, afirma que a falta de regramento impede o avanço da tecnologia, mesmo diante de um cenário de crescente necessidade de flexibilidade no sistema elétrico. Ele ressalta que o sinal econômico, por si só, não é suficiente para viabilizar projetos de armazenamento sem que existam normas sobre despacho, compensação e integração dos sistemas à rede.

Atualmente, o Brasil enfrenta cortes recorrentes no fornecimento de energia em regiões como o Nordeste e o norte de Minas Gerais, situações que poderiam ser mitigadas com o uso de BESS. Ainda assim, não há nenhum grande projeto de baterias em operação no país. Há apenas pilotos isolados, geralmente conectados a subestações, mas sem escala comercial.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou que pretende publicar uma regulamentação preliminar sobre o tema até maio, mas ainda não há definição sobre um cronograma concreto para a realização de leilões ou chamadas públicas de contratação.

Mercado livre como caminho

Luis Pita, diretor comercial global da Atlas e responsável pela operação da empresa no Brasil, argumenta que o país não precisa depender exclusivamente de leilões públicos para impulsionar a adoção dos BESS. Ele defende que, com uma regulação robusta, o mercado livre de energia, onde geradoras negociam diretamente com grandes consumidores, poderia viabilizar a demanda necessária para justificar os investimentos.

Pita ressalta que, enquanto o Brasil possui cerca de 40 GW de geração solar e eólica centralizada, o Chile conta com apenas 13,5 GW. Ainda assim, os chilenos projetam instalar 5 GW de capacidade em baterias nos próximos cinco anos. Para ele, isso demonstra que o avanço depende mais da segurança jurídica e do ambiente regulatório do que do tamanho da matriz.

No Brasil, a expectativa é de que o governo federal promova algum tipo de chamamento público para contratação desses sistemas ainda em 2025. No entanto, nenhum detalhe foi oficialmente divulgado, o que gera insegurança entre os investidores.

Dependência externa e oportunidades

Curiosamente, os sistemas de armazenamento utilizados no Chile foram fornecidos pela chinesa Sungrow, que fabrica os BESS a partir de células produzidas pela também chinesa CATL. Os equipamentos são montados na Ásia e exportados para os projetos latino-americanos. A região de Antofagasta, onde estão as instalações, abriga importantes reservas de cobre e lítio, minerais essenciais para a produção de baterias.

Esse dado escancara outra contradição compartilhada com o Brasil: enquanto os países latino-americanos exportam matéria-prima em grande escala, os produtos com maior valor agregado são importados a preços elevados. A dependência tecnológica limita a autonomia regional na transição energética e evidencia a urgência de políticas industriais voltadas ao fortalecimento da cadeia local de valor.

Exit mobile version