Maior evento do setor elétrico reúne agentes públicos e privados para discutir riscos, oportunidades e soluções diante da transição energética e dos avanços tecnológicos
A 20ª edição do Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico (ENASE) encerrou-se nesta quinta-feira (12), no Rio de Janeiro, com uma série de painéis que colocaram a digitalização, a inteligência artificial (IA) e os desafios da regulação no centro das discussões sobre o futuro da energia no Brasil. O evento, que reuniu mais de 2 mil participantes entre representantes do governo, empresas, associações e especialistas, reafirmou a necessidade de decisões estratégicas urgentes para garantir a segurança do suprimento, a competitividade e a sustentabilidade do setor.
Entre os temas centrais abordados estiveram a consolidação de data centers e da Internet das Coisas (IoT), o desenvolvimento do Open Energy, o avanço da comercialização de créditos de carbono e a indefinição regulatória das eólicas offshore. Especialistas alertaram que o Brasil pode comprometer sua transição energética se não promover marcos legais claros e investimentos consistentes.
Tecnologia e megatendências transformando o setor
Durante o evento, a MIT Technology Review Brasil apresentou o relatório “10 Megatendências para o Setor de Energia”, através de Hudson Mendonça (Energy Summit Global). O estudo destacou tecnologias emergentes como captura de carbono, baterias avançadas, fusão nuclear, combustíveis sustentáveis e pequenos reatores modulares. Contudo, a ênfase maior foi dada à inteligência artificial e seu papel decisivo na gestão de redes, previsão de falhas e eficiência no consumo.
“Não é mais possível planejar energia sem considerar o impacto da IA, do IoT e da análise preditiva. A energia precisa estar integrada à inovação e à sustentabilidade desde o início”, afirmou Mendonça. Segundo ele, os investimentos globais em transição energética atingiram US$ 1,77 trilhão em 2023, e o Brasil precisa acelerar sua atuação para não perder competitividade internacional.
Eólicas offshore: janela de oportunidade pode se fechar
A regulação das eólicas offshore, apesar da sanção da Lei nº 14.801/2024, ainda é vista com incerteza. Representantes da ABEEólica, Ocean Winds e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) alertaram que o país corre o risco de perder uma janela de oportunidades globais se não avançar com um cronograma concreto de cessão de áreas e regras técnicas claras.
Com mais de 180 GW em projetos aguardando licenciamento e uma expectativa de R$ 400 bilhões em investimentos, o setor cobra segurança jurídica para atrair capital e dar escala a essa nova fronteira da geração renovável no Brasil.
Open Energy e a revolução dos dados energéticos
A proposta da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) para implementar o Open Energy — modelo que espelha o Open Finance e permite a abertura e compartilhamento de dados energéticos com autorização do consumidor — foi debatida por representantes da CCEE, Abraceel, Agora Energia, BIP Group e Way2.
A expectativa é que, ao liberar os dados de consumo de energia de forma estruturada e segura, o setor possa oferecer produtos mais personalizados, melhorar a experiência do consumidor e ampliar a concorrência no mercado. “A digitalização com inteligência de dados é o que vai permitir ao consumidor tomar decisões mais conscientes e ao mercado oferecer produtos personalizados”, afirmou Rodrigo Ferreira, presidente da Abraceel.
Democratização do mercado livre e justiça social
A Medida Provisória nº 1.300/2024, que propõe a ampliação do acesso ao mercado livre de energia, também foi pauta prioritária. Atualmente, apenas cerca de 0,03% dos consumidores residenciais estão nesse ambiente, enquanto a geração distribuída já atende mais de 5 milhões de unidades consumidoras.
Rodrigo Ferreira (Abraceel), Marcos Madureira (Abradee), Daniela Alcaro (Stima Energia) e Dri Barbosa (N5X) defenderam que a ampliação do mercado deve vir acompanhada de políticas públicas que garantam inclusão social e equilíbrio regulatório. Distribuidoras destacaram que a transição precisa considerar adaptações nos modelos de negócios tradicionais.
Risco de fornecimento exige novos leilões
O painel sobre confiabilidade do sistema acendeu o alerta: sem um novo leilão de capacidade em 2025, o Brasil pode enfrentar riscos reais de suprimento já em 2026. Xisto Vieira, presidente da ABRAGET, afirmou que “na simulação de 2026, o sistema não fecha”, caso não haja térmicas para assegurar a geração firme em períodos críticos.
Charles Lenzi (ABRAGEL) e Eduardo Rossetti (BBCE) reforçaram que o sistema precisa valorizar adequadamente a potência firme. A ABRACE também chamou atenção para os encargos elevados que comprometem a competitividade da indústria e defendeu uma reforma estrutural no modelo tarifário.
Conclusão: a energia como vetor de inovação e inclusão
O ENASE 2025 terminou com um consenso: o setor elétrico brasileiro precisa integrar a inovação tecnológica à sustentabilidade, assegurar a segurança energética e ampliar o acesso dos consumidores aos benefícios do mercado livre. A digitalização, a inteligência artificial e a eficiência regulatória serão fundamentais para conduzir esse processo com equilíbrio entre competitividade, inclusão e confiabilidade.