Decreto eleva alíquotas sobre crédito, câmbio e previdência privada, pressionando setores estratégicos e gerando insegurança jurídica e econômica
O governo federal publicou, em 22 de maio de 2025, o Decreto nº 12.466/2025, que estabelece um aumento expressivo das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em diversas operações, como crédito, câmbio e seguros, além de impactar diretamente o setor de previdência privada de alta renda.
Embora o IOF seja um imposto tradicionalmente utilizado como instrumento de regulação econômica, especialistas do setor jurídico e tributário consideram que a medida tem caráter claramente arrecadatório, impondo novos desafios, sobretudo para setores que dependem fortemente de crédito para financiar seus projetos — como o setor elétrico e de infraestrutura.
A norma já está em vigor para a maioria das operações, com exceção de contratos específicos, como “forfait” e “risco sacado”, que passarão a ser tributados a partir de 1º de junho de 2025.
Custo do crédito dispara e ameaça a expansão do setor elétrico
Um dos setores mais impactados é o elétrico, que depende de financiamentos robustos para sustentar projetos de geração, transmissão e distribuição de energia. A elevação da alíquota máxima de crédito empresarial de 1,88% para até 3,95% ao ano praticamente dobra o custo de operações financeiras, afetando diretamente a viabilidade de novos empreendimentos.
“O decreto impacta diretamente quem depende de financiamento e crédito, elevando o custo do capital. Isso pode gerar efeitos econômicos de médio prazo, desacelerando investimentos, sobretudo em setores estratégicos como energia, infraestrutura e indústria”, alerta o advogado Eduardo Natal, sócio do escritório Natal & Manssur.
Essa mudança ocorre em um momento crítico para o setor, que busca acelerar a transição energética, expandir a geração renovável e modernizar a infraestrutura. Projetos de energia solar, eólica e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que já operam com margens apertadas, podem ser inviabilizados ou, no mínimo, sofrer atrasos.
Impactos também recaem sobre câmbio e operações internacionais
A nova regra também cria uma alíquota única de 3,5% para operações de câmbio, incluindo remessas internacionais, cartões, compra de moeda estrangeira e investimentos no exterior. Empresas do setor elétrico, especialmente aquelas que dependem de equipamentos importados, financiamentos internacionais ou que possuem controladoras estrangeiras, sentirão um impacto expressivo no custo das operações cambiais.
“Essa medida tende a desestimular investimentos estrangeiros no Brasil e onerar empresas que fazem movimentações internacionais de rotina, como é o caso de muitas empresas de energia e infraestrutura”, observa o tributarista Ranieri Genari, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/Ribeirão Preto.
Empresas do Simples Nacional também são afetadas
O impacto não se limita às grandes corporações. Empresas optantes pelo Simples Nacional, inclusive aquelas que atuam na geração distribuída e no fornecimento de serviços para o setor elétrico, também passam a arcar com uma alíquota de até 1,95% ao ano.
Na avaliação de Genari, a medida contraria o princípio constitucional que prevê tratamento diferenciado e favorecido às micro e pequenas empresas, podendo gerar questionamentos judiciais.
Mudanças também afetam planejamento patrimonial e previdência privada
Além do setor produtivo, o decreto mira investidores de alta renda ao instituir uma cobrança de 5% de IOF sobre aportes mensais superiores a R$ 50 mil em planos VGBL, afetando diretamente estratégias de planejamento patrimonial e sucessório.
“Embora a justificativa seja coibir o uso desses produtos para blindagem patrimonial, há reflexos claros no planejamento de longo prazo, especialmente para profissionais do setor que utilizam esses instrumentos como parte da sua estratégia financeira”, explica a advogada Lívia Heringer, especialista em Direito Tributário.
Resumo das principais alterações do Decreto nº 12.466/2025:
- 📈 Crédito empresarial: alíquota máxima sobe de 1,88% para 3,95% ao ano;
- 🏢 Empresas do Simples Nacional: passam a pagar até 1,95% ao ano;
- 💰 Operações de câmbio: alíquota única de 3,5%, aplicável a cartões, remessas, compra de moeda estrangeira e aplicações no exterior;
- 🔒 Previdência privada: incide 5% de IOF sobre aportes mensais acima de R$ 50 mil em VGBL;
- 📜 Operações como “risco sacado” e “forfait” passam a ser tributadas a partir de 1º de junho de 2025.
Cenário de alerta: mais custo, menos investimento e risco de repasse ao consumidor
O impacto do aumento do IOF sobre o setor elétrico é profundo. As empresas terão que recalcular seus custos, repensar estratégias de financiamento e, em muitos casos, renegociar prazos ou buscar alternativas mais caras no mercado externo.
Na prática, esse cenário pode levar à redução de investimentos, atrasos em obras de expansão da rede elétrica e no desenvolvimento de projetos de energia renovável, além do risco de que os custos acabem, mais cedo ou mais tarde, sendo repassados ao consumidor final.
Além dos efeitos econômicos, a medida gera insegurança jurídica, podendo resultar em uma nova onda de judicialização, especialmente por parte de entidades que representam pequenos negócios e setores fortemente dependentes de financiamento.
O setor elétrico, considerado estratégico para o desenvolvimento econômico do Brasil, acompanha com apreensão os desdobramentos dessa política tributária, que, se não for revista, pode frear a transição energética e comprometer o avanço de projetos essenciais para o país.