Descumprimento de prazos compromete segurança do sistema elétrico em três estados; projetos impactariam diretamente mais de meio milhão de usuários no Centro-Oeste e Sudeste
A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) recomendou nesta terça-feira (13), ao Ministério de Minas e Energia (MME), a caducidade de cinco contratos de concessão de transmissão firmados com a MEZ Energia e Participações Ltda., em razão do descumprimento reiterado dos prazos contratuais e atrasos na implantação de obras essenciais ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
As concessões em questão foram obtidas pela empresa nos Leilões de Transmissão nº 001/2020 e nº 001/2021, mas, segundo avaliação técnica da ANEEL, a MEZ não demonstrou capacidade de executar os empreendimentos conforme estabelecido nos contratos. A decisão da diretoria colegiada da agência ocorre após diversas tentativas de interlocução e acompanhamento próximo por parte das áreas técnicas da reguladora.
A recomendação inclui a extinção dos Contrato de Concessão nº 2/2021, 6/2021, 7/2021, 13/2021 e 15/2021. Esses projetos têm importância estratégica para o reforço do sistema de transmissão em estados como São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, atendendo a regiões com crescimento acelerado da demanda e desafios históricos no fornecimento de energia elétrica.
Projetos paralisados colocam em risco estabilidade do sistema
Segundo a relatora do processo, diretora Agnes da Costa, os empreendimentos da MEZ são cruciais para a estabilidade elétrica de áreas densamente povoadas e economicamente relevantes. Um dos projetos mais críticos prevê a conexão em 345 kV entre as subestações Norte e Miguel Reale, em São Paulo. Ao entrar em operação, ele aumentaria significativamente a confiabilidade do abastecimento em regiões como Zona Norte, Zona Leste, Zona Sul, ABC Paulista, Mairiporã, Jaguari e São José dos Campos.
O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) também apresentou parecer técnico detalhado, alertando para os impactos negativos ao SIN caso as obras não sejam finalizadas. Entre os riscos estão sobrecargas, interrupções no fornecimento e limitações ao crescimento de cargas essenciais — incluindo novos polos industriais e empreendimentos de saneamento básico.
Impactos diretos em mais de 500 mil usuários
A ANEEL detalhou que os projetos paralisados afetarão diretamente a qualidade do serviço para mais de 500 mil usuários em diferentes regiões do país. No Mato Grosso do Sul, aproximadamente 68 mil pessoas em municípios como Mundo Novo, Japorã, Iguatemi e Eldorado terão o abastecimento comprometido. A situação impacta ainda programas de irrigação agrícola em áreas de fronteira.
No Mato Grosso, cerca de 440 mil usuários, sobretudo na região metropolitana de Cuiabá, dependeriam dos reforços de rede planejados. O avanço da economia local e o crescimento populacional vêm pressionando a infraestrutura elétrica, o que torna a execução dessas obras ainda mais urgente.
Sabesp e expansão urbana em São Paulo ameaçadas
Em São Paulo, o projeto de transmissão se conecta a um novo polo industrial impulsionado pela instalação de uma unidade da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Essa planta é considerada peça-chave para combater problemas de escassez hídrica na Região Metropolitana.
A falta de conclusão das obras de transmissão pode afetar não apenas o sistema elétrico, mas a eficiência da política pública de saneamento básico na capital e arredores.
Tentativas de regularização não surtiram efeito
A ANEEL reforçou que, apesar de múltiplas reuniões com a MEZ, não houve apresentação de plano de ação viável, tampouco proposta concreta de transferência de controle societário, alternativa prevista na Resolução Normativa nº 1.077/2023. Diante disso, a diretoria concluiu pela incapacidade da empresa em cumprir suas obrigações regulatórias.
Com a recomendação formalizada ao MME, cabe agora ao ministério a análise final para a decretação da caducidade dos contratos e possível relicitação dos ativos. O movimento segue a política da ANEEL de tolerância zero com descumprimentos graves e de priorização da confiabilidade e da estabilidade do sistema elétrico nacional.
A decisão da agência serve também como sinal ao mercado sobre a necessidade de rigor na avaliação de riscos por parte das empresas que disputam concessões públicas, sobretudo no setor elétrico, onde atrasos podem comprometer a segurança energética de milhões de brasileiros.