Relatório do Inesc aponta corte de quase 18% no orçamento para energias renováveis, enfraquecendo a transição energética e aumentando a dependência de combustíveis fósseis
O Brasil está prestes a enfrentar um retrocesso significativo em sua agenda de transição energética. Um relatório do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) revela que o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 prevê uma redução drástica nos investimentos destinados à transição energética, passando de R$ 4,44 bilhões em 2024 para R$ 3,64 bilhões no próximo ano. Esse corte de quase 18% pode comprometer as metas climáticas do país e a sua capacidade de avançar na adoção de energias renováveis.
O cenário é especialmente preocupante diante da intensificação dos impactos das mudanças climáticas, evidenciados recentemente pelas enchentes devastadoras no Rio Grande do Sul e as secas que assolam outras regiões do Brasil. Enquanto o mundo busca soluções urgentes para mitigar os efeitos da crise climática, o Brasil parece caminhar na contramão ao não priorizar as energias limpas em seu orçamento.
Contradição entre discurso e realidade
Apesar de a transição energética ser uma prioridade nas discussões globais e um tema de destaque nas metas ambientais brasileiras, o orçamento federal sugere um descompasso entre o discurso e a prática. O relatório do Inesc aponta que, embora o Plano Plurianual (PPA) 2024-2027 tenha criado um programa específico para a transição energética, os recursos destinados a essa área são considerados insuficientes.
Além disso, o relatório chama atenção para a destinação dos recursos. Metade do orçamento do Programa de Transição Energética — cerca de R$ 5,10 milhões — será alocada para a manutenção da indústria de petróleo e gás natural. Ou seja, enquanto o governo afirma querer impulsionar as energias renováveis, uma parte significativa dos recursos ainda está sendo direcionada para a continuidade da dependência brasileira de combustíveis fósseis.
Para Cássio Cardoso Carvalho, assessor político do Inesc, essa distribuição orçamentária revela um cenário contraditório. “Enquanto o PPA estabelece como meta promover a participação de energias renováveis e aumentar a eficiência energética, o orçamento mostra que uma parcela significativa dos recursos está sustentando a indústria de combustíveis fósseis”, alerta.
Impacto na agricultura familiar e no gás de cozinha
O relatório do Inesc também destaca como a redução dos investimentos em energias renováveis afeta outros setores cruciais, como a agricultura familiar. Programas que incentivam o uso de energias limpas no campo sofreram cortes significativos. Dois dos principais planos orçamentários do Ministério do Desenvolvimento Agrário voltados para a participação da agricultura familiar nas cadeias de energias renováveis terão seus recursos reduzidos em 26,36%. Esse corte pode dificultar o acesso de pequenos produtores a fontes de energia sustentável, afetando diretamente o desenvolvimento rural.
Outro ponto crítico é a redução dos recursos destinados ao auxílio gás de cozinha para famílias de baixa renda. No PLOA de 2025, o orçamento para esse benefício, que faz parte da política de transição energética, foi reduzido drasticamente, passando de R$ 3,64 bilhões em 2024 para apenas R$ 600 milhões em 2025, o que representa uma queda de 83,52%. Essa redução deve impactar milhares de famílias que dependem do subsídio para adquirir gás de cozinha.
Ciência e tecnologia em foco
Se por um lado o orçamento para a transição energética sofreu cortes, por outro, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) teve um aumento significativo em sua previsão orçamentária para 2025, passando de R$ 800 milhões para R$ 3,03 bilhões, um crescimento de 279%. Esse aumento está alinhado com o Programa Nova Indústria Brasil (NIB), que visa modernizar o setor industrial com foco na transição energética.
Embora esse incremento seja um passo positivo, ele não compensa os cortes nas outras áreas essenciais para a transição energética, segundo o Inesc. “O aumento no orçamento para ciência e tecnologia é relevante, mas é fundamental que o governo mantenha uma visão holística sobre a transição energética, garantindo que todos os setores recebam os investimentos necessários”, destaca Carvalho.
Um alerta para o futuro
O corte de verbas para a transição energética no Brasil em 2025 acende um alerta sobre o futuro das metas climáticas do país. Com a redução dos recursos, o avanço nas energias renováveis pode ser retardado, e o Brasil corre o risco de não cumprir os compromissos assumidos em fóruns internacionais, como o Acordo de Paris.
Além disso, a falta de investimentos consistentes em energias limpas compromete a segurança energética do país e pode perpetuar a dependência de combustíveis fósseis, justamente quando o mundo se mobiliza para encontrar soluções sustentáveis.
O relatório do Inesc conclui que, para que o Brasil alcance suas metas de redução de emissões e transição energética, será necessário um aumento significativo nos investimentos em energias renováveis e uma reavaliação das prioridades orçamentárias. O futuro energético do Brasil depende, mais do que nunca, de decisões políticas que promovam o desenvolvimento sustentável.